O então governador Aécio Neves prometeu que, depois de reformado, o Mineirão seria administrado por Atlético e Cruzeiro. Na hora “agá”, estranhamente, proibiu que os clubes participassem até da licitação, e o estádio ficou para empreiteiras, com um contrato que foi um presentão para elas. Em Londres, a prefeitura entregou o Estádio Olímpico para um dos grandes clubes da cidade, o West Ham. Confira a sequência da reportagem do Estadão, sobre o legado olímpico dos Jogos de 2012. Fala também do caos do que seria o legado dos Jogos 2016:
* “Estádio dos Jogos vira a casa do West Ham na Liga Inglesa”
Prefeitura de Londres peita rivais e aluga arena ao clube pelo valor de R$ 10,5 milhões para ele mandar 25 partidas
Glauco de Pierri, enviado especial a Londres*, O Estado de S.Paulo
“Imagine se o governo do Rio de Janeiro repassasse o Maracanã para o Vasco, ou para outro time grande da cidade. Você acha que a torcida do Flamengo, por exemplo, não reclamaria e criticaria o acordo?”. Foi assim, aos risos, que Ben Fletcher, o executivo responsável pelas estratégias e pelo andamento do legado do Parque Olímpico da capital britânica, explicou a enxurrada de críticas que recebeu após o acerto entre a prefeitura da cidade e o West Ham, clube que passou a mandar seus jogos do Campeonato Inglês no Estádio Olímpico.
“Aqui em Londres temos muitas equipes grandes, todas com torcidas gigantescas. Tem Arsenal, Tottenham, Chelsea, Crystal Palace, Fulham… esqueci algum? Enfim, esse tipo de crítica a gente entende, porque envolve paixão do torcedor. Nós ajudamos apenas um time, o West Ham, e sabíamos que a maior parte da população de Londres não entenderia”, diz Fletcher. Mas os organizadores se prepararam para isso por um tempo.
De fato, o acordo entre Londres e o clube é benéfico para os ‘Hammers’, como eles são chamados. O time paga aluguel de 2,5 milhões de libras por ano, o equivalente a R$ 10,5 milhões – um valor irrisório para uma equipe que disputa a Liga Inglesa, cujo orçamento anual é de cerca de R$ 520 milhões. Pelo acordo, o West Ham pode disputar 25 jogos por ano na estádio – a equipe tem 19 partidas como mandante no torneio nacional. Nesse cenário, a Prefeitura de Londres tenta acordo com alguma empresa para exploração dos naming rights. Quando o West Ham manda seus jogos, o local chama-se ‘London Stadium’. Mesmo se uma empresa topar dar nome à arena, 40% do valor vai para os cofres do time.
“É muito difícil quando a cidade ajuda especificamente um único clube. Certamente você será criticado. Mas é melhor você ter 50 mil, 60 mil pessoas felizes a cada jogo do West Ham, do que deixar o estádio vazio, parado, e, por consequência, sem ninguém. Não é só o futebol. Teremos shows, uma série de outros eventos no estádio. E tem mais: o futebol vai atrair outra parte da população, que passará a usar e usufruir dessa estrutura. Não temos dúvidas. Essa é uma outra forma de manter o Parque Olímpico com eventos e com a população usando o seu complexo”, diz Fletcher.
Além do ‘baixo’ valor com o aluguel, o West Ham fica com o dinheiro dos ingressos e com uma porcentagem da venda de comida e bebidas nas lanchonetes oficiais da arena. Logo na entrada do estádio, o clube possui uma megastore, em que comercializa todo tipo de produto, desde camisas oficiais até uniformes antigos, flâmulas, agasalhos e outras lembrancinhas.
O guardião do Parque Olímpico conta que parte de quem critica o acordo torce pelo próprio West Ham. Diz, porém, que a bronca é mais pelo abandono do antigo local das partidas, o Upton Park – estádio onde o clube passou mais de 100 anos.
Vila dos Atletas abre as portas para moradores em Londres
Espaço dos competidores durante a Olimpíada de 2012 agora serve como moradia
A menos de um quilômetro do Parque Olímpico de Londres, a Vila Olímpica onde os atletas ficaram hospedados agora serve de moradia para muitas pessoas comuns. Neto de imigrantes portugueses, Antonio Seppas mora em um dos apartamentos do local, mas não quer mostrá-lo. “É igual a todos os outros. Mas você sabia que uma parte paga aluguel bem barato e a outra paga mais caro?”, afirmou, da sacada da janela de sua moradia, no primeiro andar.
“Eu acho isso legal, de ajudar as pessoas comuns. Mas tinha de ser para todo mundo igual”, diz. “Agora estão construindo outros apartamentos, e eu quero me mudar para esses novos.” Questionado sobre os motivos, já que as construções mais recentes têm a mesma planta das erguidas para os Jogos de 2012, ele diz que sua intenção é comprar definitivamente o imóvel. “Quero tentar pegar alguma facilidade para financiar”, disse.
Alice Spencer é uma senhora divertida. Voluntária no Mundial de Atletismo Paralímpico, que acaba hoje, ela é de Yorkshire, e atende a todos com simpatia. Sua missão é resolver problemas e tirar dúvidas. Ela responde perguntas de todos os tipo. “Olha, eu realmente não tenho a menor ideia se a gente poderia pescar por aqui”, diz a um garoto que perguntou se há peixes no canal, e se ele poderia pescá-los. Referia-se a um dos canais do Rio Lea, que passa dentro do parque olímpico e onde visitantes podem andar de pedalinho. Mas vai atrás de uma solução.
Alice é engajada em Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Esteve no Rio em 2016 – além dela, outros voluntários afirmaram que fizeram o mesmo, e que agora estão de malas prontas para Tóquio-2020. “É uma forma de vida. Esporte é vida”, diz. Ela não conseguiu ir para os Jogos de Pequim, em 2008, mas foi para Sidney-2000 e Atenas-2004. “A Grécia já vivia um problemão financeiro, e acho que aumentou depois que o país foi sede dos Jogos. Não se aproveita quase nada hoje, é triste saber que não se pensou no que fazer com as estruturas da competição após as disputas”, diz.
Ao saber que a reportagem era do Brasil, deu uma bronca no repórter do Estado. “Mas e o Brasil? O que o Rio está fazendo com o seu Parque Olímpico que só chegam notícias ruins aqui? Aquilo era lindo, deveria ser como em Londres, utilizado agora pelo povo”, sentencia.
Ela diz lembrar bem do que seus colegas falavam de Deodoro, cenário das provas de canoagem e hipismo, entre outras. “Muitos me diziam que após os Jogos tudo seria abandonado. Dizia que não. Mas tinham razão. Precisam resolver isso, senão estragará tudo”, diz.
Parque Olímpico do Rio ainda procura um caminho
Complexo na Barra ainda não é atrativo para a iniciativa privada
Dez meses após os Jogos do Rio-2016, o Parque Olímpico da Barra ainda não conseguiu se firmar como opção viável para eventos esportivos ou shows na cidade. Pior: o plano de legado e ocupação só foi literalmente para o papel no mês passado.
A intenção inicial era conceder todas as instalações à iniciativa privada, mas não houve interessados. Assim, no fim de 2016, o governo federal assumiu a gestão das Arenas Cariocas 1 e 2, do Velódromo e do Centro Olímpico de Tênis. A Arena Carioca 3, a Arena do Futuro e o Estádio Aquático ficaram nas mãos da Prefeitura do Rio.
As instalações sob cuidado da União só tiveram seu plano de legado divulgado em junho, o que motivou pedido de multa por parte do Ministério Público Federal do Rio (MPF-RJ). Desde o início do ano, eventos esportivos esporádicos têm sido realizados no local, como torneios de tênis, ciclismo e vôlei de praia. Este fim de semana, haverá um evento de jiu-jitsu.
As arenas da Prefeitura do Rio, por sua vez, estão praticamente paradas. As escolas prometidas nem sequer aparecem no horizonte porque o município alega falta de recursos para desmontar a Arena do Futuro.
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