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E lá se foi o Décio Alves de Morais, uma lenda do jornalismo do interior de Minas

Aos 95 anos de idade, uma figura queridíssima, em Poços de Caldas, onde fez história, especialmente no futebol, merecedor de todas as homenagens que ainda tem recebido. Obrigado à assessoria de imprensa da Caldense, que nos enviou a informação e uma ótima entrevista concedida por ele à revista do clube em 2017. Histórias do futebol mineiro e brasileiro, que valem ser lidas:

* “Morre aos 95 anos o Jornalista Décio Alves de Morais”

Faleceu no final da tarde desta terça-feira (25), aos 95 anos, o jornalista Décio Alves de Morais. Décio viu de perto os acontecimentos mais importantes da história da Caldense e registrou inúmeros momentos marcantes em fotos e textos. Seu trabalho único revolucionou, documentou e eternizou as mais diversas façanhas da equipe alviverde entre as décadas de 1940 e 1990.

O falecimento de Décio Alves de Morais deixa uma lacuna imensa na imprensa poços-caldense e é uma perda incalculável para a memória da história alviverde. A Associação Atlética Caldense manifesta os mais profundos sentimentos de pesar aos familiares e amigos.

Em outubro de 2017, Décio concedeu entrevista à Caldense, a matéria inclusive foi publicada na edição de setembro da revista do clube. Confira na íntegra a reportagem, em que Sr. Décio relata suas principais lembranças ao longo dos anos em que cobriu a Veterana.

Seleção de 58 em Poços

Em 1958 a seleção brasileira esteve em Poços de Caldas para se preparar para a Copa da Suécia. O período foi muito bom. O Brasil ficou hospedado no Quisisana Hotel. Na hora do treino, um ônibus levava a delegação para o campo da Caldense. Quando iam trabalhar a parte física, as atividades eram no Country Club. A estadia deles aqui foi maravilhosa, demos total cobertura. Ficou marcado como um dos maiores acontecimentos esportivos de Poços. Tanto é que a equipe foi campeã mundial.

Garrincha em Poços

Em 1972 o Olaria de Garrincha veio a Poços para um amistoso em 7 de setembro. Foi a última partida do “anjo de pernas tortas” como profissional. A Caldense estava em uma fase excelente e ganhou de 5 a 1.  Após o jogo o Garrincha foi muito modesto, atendeu todo mundo, brincou com todo mundo, um verdadeiro garoto. Ele soube reconhecer que a Caldense jogou melhor e ressaltou a qualidade dos jogadores alviverdes.

Pelé em Poços

No ano de 1974 o Santos jogou contra a Caldense, no Cristiano Osório, em uma partida combinada para pagar parte do passe de Luiz Carlos Beleza, lateral que havia sido contratado pelo alvinegro praiano. O jogo foi em uma quarta-feira a noite, com muita chuva. O Santos venceu por 1 a 0. O campo estava escorregadio e por conta disso o Pelé foi substituído no segundo tempo. Foi o último jogos dele em Minas Gerais.

Mauro Ramos de Oliveira

Em todo lugar que o Mauro ia, ele levava a torcida junto. A cidade gostava muito dele, era um “gentleman”, sempre atendia à todos. Ele marcou época na Caldense, na década de 40 fez vários jogos por aqui. Ele era fora de série. Um estilo espetacular, com futebol excelente. Ele se destacou tanto que a Esportiva o levou para São João e de lá foi para São Paulo e depois Santos. Ele sempre colaborou muito com o Verdão, seja atuando como zagueiro ou em outras posições.

O fundador

Convivi com o Joãozinho, filho do João de Moura Gavião, fundador da Caldense. Ele falava que seu pai era muito reservado, fechado e não chegou a lhe contar muitas coisas sobre a fundação do clube. Até porque a Associação surgiu em 1925 e o João de Moura faleceu em 1927.

Primeiros anos futebol

Nos anos primeiros anos de futebol, o clube não tinha muita rotina de treinos. Os próprios jogadores definiam os dias das atividades. Cada levava suas chuteiras, meias e calções. Mais para frente começaram a confeccionar camisas e jogar uniformizados. Os atletas tinham uma dedicação muito grande pelo time. Eles mesmos compravam o material e se apresentavam. Antigamente não havia muitos campeonatos, a maioria das partidas eram amistosas. Me recordo apenas de uma competição estadual em Caxambu. Estamos falando dos anos 30, 40 e 50.

O termo Veterana

Em 1940 a Caldense já tinha conseguido fama de ser um bom time. Na época o senhor Fosco Pardini, que foi presidente do clube por vários anos e tinha um amor muito grande pela instituição, estava pensando alguns nomes para se referir à equipe. Com isso, pelo fato de a Caldense ser um dos times mais antigos da região, ele começou a chamá-la de “Veterana”. O termo foi bem aceito e é utilizado até hoje.

Pó de Mico

Durante um período, havia uma turma que ficava assistindo aos jogos em um barranco atrás do gol e torcendo contra a Caldense. O Fosco Pardini via aquilo e não aceitava. Então, em um belo dia, mandou alguém esparramar pó de mico naquele espaço onde o pessoal ia ficar. Quando a turminha chegou e sentou no barranco, começou a sentir uma coceira danada na perna e nem assistiu ao jogo. Foram embora correndo. Até hoje devem achar que eram formigas.

Dondinho

Quando a Caldense viajava para jogar em cidades da região, o Sr. Juca Anacleto, presidente na época, telefonava para Três Corações e contratava o Dondinho, que era um grande jogador e depois veio a ser pai do Pelé. Ele exigia hotel e transporte para poder jogar. Lembro certa vez de um jogo em São José do Rio Pardo, onde ele reforçou a Caldense. No primeiro tempo ficou no banco e o time foi para o intervalo perdendo de 2 a 0. Então começamos a falar que estava na hora de colocar o Dondinho. O Juca foi lá e falou com o Dondinho. Ele entrou no jogo junto a um amigo que tinha vindo junto, fez um carnaval, marcou três gols e deu a vitória por 3 a 2 para a Veterana.

Ídolos

O jogador da cidade que mais chamou a atenção na Caldense nessas primeiras décadas, na minha opinião, foi o Tino. Ele era espetacular, tanto na defesa, quanto no ataque. Parecia ter sete fôlegos, jogava em qualquer posição, exceto no gol. Teve um jogo contra o Botafogo de Ribeirão Preto em que ele deu um show à parte e a Caldense ganhou por 3 a 2. Ele deixou saudades. Outro jogador que se destacou muito foi o centro-médio Pocidônio, que veio da Portuguesa de Desportos e virou praticamente dono do time. Cada dia que passava a equipe se superava e fazia grandes apresentações.

Brandãozinho

No interior de Minas não havia muitas equipes, somente na capital. Por isso a Caldense jogava muito no Estado de São Paulo. Frequentemente ia para Campinas enfrentar Guarani, Ponte Preta e o Campinas Futebol Clube. Trouxemos inclusive o Brandãozinho de lá, que foi jogador da seleção brasileira. Ele cismou que queria vir para Poços. Nós conseguimos a adesão dele e ele ficou um bom tempo na cidade jogando pela Veterana.

Rivalidade

O principal rival da Caldense era a Esportiva Sanjoanense. Todo jogo em Poços ou em São João da Boa Vista lotava o estádio. Inclusive em algumas partidas, os torcedores da Veterana foram de trem até o interior paulista para assistir. Era uma rivalidade sadia, nunca houve problemas. A maior goleada que recordo no confronto foi uma vitória da Caldense por 5 a 1 em Poços.

A torcida

A torcida alviverde se reunia no Café do Henrique, no Mercado Municipal. Ali o pessoal comia pastel, lanche, ficava na expectativa e decidia o que seria feito antes do jogo. Havia até um painel onde escreviam a escalação dos jogadores. Muita gente comparecia e apoiava incondicionalmente. Lá era o ponto de encontro também depois dos jogos. A turma comentava os lances da partida e tudo mais. Em 1950 criaram a  Torcida Organizada Caldense, mas não havia muita organização. Alguns levavam instrumentos para agitar e vibrar.

57 partidas invictas

Entre 1960 e 1961 a Caldense montou um time imbatível. Vencia todos os adversários e às vezes empatava alguns jogos. A cada dia que passava, a sequência de invencibilidade ia aumentando, o time jogava melhor e a expectativa por mais vitórias crescia. Inclusive tinha um desenhista bastante talentoso na cidade, chamado Sálvio de Araújo, que em todos os jogos publicava uma charge falando sobre o resultado da partida. Isso marcou muito. A torcida jogava junto, mas também havia uma turma que torcia contra, para ver a Veterana ser derrotada. Após 57 partidas sem perder, a Caldense foi superada por 1 a 0 para o Circulista de Araras. Foi uma decepção. O clima dos jogadores após a partida era totalmente triste. Eu estava no campo e foi lamentável perder daquele jeito, com um gol no finalzinho. O gol do Circulista surgiu numa bola pelo lado esquerdo do campo de ataque. O rapaz levou ela para a área e conseguiram driblar a defesa da Caldense. Quando olharam, a bola já estava na rede. Um pecado. Mas enquanto a sequência durou foi maravilhoso, não é qualquer time que alcança um feito desse.

A doação das terras do Cristiano Osório

A Caldense tinha vários diretores. Um deles era o José Geraldo Parreira, que vivia em Poços e tinha família em São João da Boa Vista. Então o contato da Caldense com o Coronel Cristiano Osório, que morava em São João e era dono do campo Chalé Procópio onde o time jogava, era feito através dele. Aos poucos foram passando as informações da Veterana para lá, conversando, até que um dia marcaram uma reunião e o Coronel Cristiano Osório resolveu doar totalmente as terras para o clube, sem pedir nada em troca. Uma atitude nobre que merece ser reconhecida

A profissionalização

A Caldense fez muito bem em ter se profissionalizado. Foi algo que começou no final dos anos 60 e teve desfecho no início dos anos 70. Nessa época havia militares que colaboravam com o clube e ajudaram na profissionalização. Disso em diante o time foi levando até começar a disputar o Campeonato Mineiro. Depois se projetou nacionalmente.

O hino

Eu era muito amigo do José Raphael Santos Netto. Ele foi um poços-caldense de grande valor. Haja vista sua história, criou a bandeira e o brasão da cidade, idealizou o Cristo Redentor. Ele queria que a Caldense tivesse algum registro musical no futebol, então se propôs a fazer um hino e doar para o clube. Como ele era muito inteligente, fez um grande trabalho e publicou a canção “Verdão” em 1973. Na época ela demorou a pegar, mas hoje todo mundo conhece a letra e sabe cantar.


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