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Razões do sucesso de Jorge Jesus, o treinador que calou os invejosos colegas brasileiros II

Capa da biografia do treinador na versão portuguesa, em sua terceira edição. No Brasil será lançada pela Editora Chiado Books. 

Na mesma página da Folha de S. Paulo sobre Jorge Jesus, no dia três de novembro, o cronista Ricardo Araújo Pereira deu detalhes da forma do treinador agir pessoal e profissionalmente.

* “Jorge Jesus ensina aos seus atletas o que fazer em 88 minutos e meio”

Se melhor documento da qualidade de um técnico é a opinião dos seus jogadores, treinador tem a certificação certa

Ricardo Araújo Pereira/Lisboa

Quando, em julho deste ano, o meu amigo carioca e flamenguista Francisco Bosco me perguntou o que eu achava da contratação de Jorge Jesus, disse: em três anos, vocês serão campeões três vezes, vencerão pelo menos uma Libertadores e vão jogar o melhor futebol desde o Zico.

Neste mês encontrei o Francisco em Portugal e ele olhou para mim como se eu fosse um profeta. Na verdade, não era preciso ter poderes especiais. Quando, em 2009, Jorge Jesus chegou ao maior clube do mundo (o Benfica, para os distraídos), era já um técnico de 55 anos e tinha uma boca muito maior do que o currículo. Embora tivesse treinado apenas times de menor dimensão, tinha uma confiança nas suas capacidades que chegava a ser cômica.

Na primeira coletiva, disse: “Comigo, estes jogadores vão passar a jogar o dobro”. Ninguém achou que ele cumpriria a promessa —e não cumpriu: os jogadores passaram a jogar o quádruplo. Nos quatro anos anteriores à chegada de Jesus, o Benfica tinha ficado três vezes em terceiro e uma em quarto —registro paupérrimo para o maior clube português, com o maior número de torcedores e mais campeonatos nacionais conquistados.

No primeiro ano, Jesus foi campeão ligando aquilo que ficou conhecido como o “rolo compressor”. Num jogo no Estádio da Luz, a casa do Benfica, o adversário era o Vitória de Setúbal. Jesus tinha má relação com o treinador adversário (o que não é raro) e, antes do jogo, anunciou aos jogadores: “O objetivo é 10 a 0”. Ao intervalo estava 5 a 0. Os jogadores recolhem ao vestiário e Jesus grita: “É para continuar. Quem tirar o pé não joga!”. A poucos minutos do fim, quando estava 8 a 0, os visitantes aproveitaram um desentendimento entre David Luiz e o goleiro e reduziram.

Dizem que, no fim do jogo, pela primeira vez na história do futebol os jogadores de um time que tinha ganho por 8 a 1 estavam meio tristes. Nos seis anos de Jesus, o Benfica foi campeão três vezes e o pior que fez foi ficar em segundo. Além disso, foi bicampeão nacional pela primeira vez em 20 anos e foi a duas finais europeias consecutivas pela primeira vez em mais de 50. No total, ganhou 10 títulos.

A primeira vez que reparei em Jorge Jesus foi em 2007. Ele treinava o Belenenses, que tinha sido convidado para um torneio de pré-época com o Real Madrid. Os espanhóis ganharam por 1 a 0 e, no fim do jogo, Bernd Schuster, técnico do Real, queixou-se de que o Belenenses tinha adotado postura demasiado defensiva. Jesus respondeu: “Com os jogadores que tu tens, dava-te três gols de avanço, mudava aos cinco e acabava aos 10.”

É uma resposta que o define bem: os times dele têm o espírito do futebol de rua, do drible malandro e exibicionista, mas consequente, a serviço da obsessão pela vitória, e aquela agressividade competitiva do garoto que, depois de fazer gol, grita para o goleiro: “Vai buscar!”.

Se o melhor documento da qualidade de um técnico é a opinião dos seus jogadores, Jesus tem a certificação certa.

Uma lenda, igual a tantas do mesmo gênero, conta que uma vez, num jantar na casa de um antigo jogador do Benfica e da seleção portuguesa, alguém perguntou: “Quem foi o melhor treinador que tiveste na carreira?” Resposta imediata: “Jorge Jesus.” A mulher dele indignou-se: “O Jesus?! Ele nem te punha a jogar, deixava-te quase sempre no banco!”. Então, calmamente, o craque disse: “Repara.” Pegou no celular e enviou a mesma mensagem para vários antigos colegas, naquela altura a serviço de Real Madrid, Chelsea, PSG: “Quem foi o melhor treinador da tua carreira?” Passados  alguns segundos, todos mandavam a mesma resposta.

Sempre que chega a um novo time, a primeira coisa que Jesus faz é perguntar ao elenco: “Em 90 minutos de jogo, sabem quanto tempo, em média, é que cada um de vocês tem a bola nos pés? Um minuto e meio. Eu vou ensinar-vos o que fazer nos outros 88 minutos e meio.” Outra lenda: ao fim de alguns meses de treino com ele, um internacional belga disse-lhe: “Mister, eu não sabia que jogava tão bem…”.

* Ricardo Araújo Pereira

https://www1.folha.uol.com.br/esporte/2019/11/jorge-jesus-ensina-aos-seus-atletas-o-que-fazer-em-88-minutos-e-meio.shtml


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Comentários:
4
  • Horacio disse:

    Caro Chico,
    Sem dúvida um bom técnico, que teve a sorte de poder reunir um bom grupo de jogadores.
    O que o diferencia de um monte de técnicos no Brasil é que pode exigir e cobrar o que quer, o Sampaoli também. É bom lembrar, nem tanto tempo tem, a figura do Rodrigo Santana, sem time para por em campo o quanto se desdobrou para agradar a gregos e troianos. Mais clássico ainda foi o Givanildo pedir reforços e ganhar um pé na bunda.
    No caso dos técnicos brasileiros só fica no cargo quem é retranqueiro, não tem outro jeito. A lei petrea dos spikes exige a demissão sumária se ocorrer 5 derrotas seguidas ou 7 alternadas. Se não for retranqueiro não fica. Fda-se o futebol.
    E esta é a realidade quem demite técnico no Brasil são os spikes, que de futebol não entendem lufas, basta ouvir alguns comentários da ‘nova geração’, serve pra tudo, basquete, voley, até novela encaixa com perfeição.
    E este é o futebol brasileiro, repleto de figuras medíocres, dentro do campo, no túnel, na mídia com um sensacionalismo do mais rasteiro e para completar a boçalidade escaldante dos cartolas, oportunistas de partidos políticos, como estamos vendo já a algum tempo, e da televisão que destrói para ganhar mais.
    O resultado é o que estamos vendo na qualidade do futebol, um lixo.

  • Juliano Salvador disse:

    Lógico, o sucesso do Flamengo passa pelo dedo do técnico também, mas não entendo este endeusamento do Jorge Jesus. Muito marketing pessoal, que me faz pensar ser o Flamengo apenas um trampolim do Jesus para ir a um grande clube europeu, embora ele mesmo tenha dito que recusou ofertas antes de vir para cá. É um técnico como os outros, cheio de altos e baixos, aproveitando seu momento de “queda do pão com a manteiga para cima”. Somente isto!

    • Helio Antonio Corrêa disse:

      JULIANO SALVADOR
      Desculpe dar pitacos no seu comentário.
      Estava tentado a concordar com você, até lembrar me , que com este mesmo time, um outro (ex) treinador estava em 6 º e correndo risco de não se classificar na liberta
      Então o que mudou? será que o jogadores do Fla estavam fazendo pirracinha com o Abelão , será que o Arrasca, Arão etc, resolveram ser titulares incontestáveis com o portuga e não queriam saber de bola com o homem do vinho e do piano?
      Nao amigo, os conceitos de jogo, foi o que mudou.
      Nós ficamos mal acostumados com estes técnicos retranqueiros, eu mesmo passei tres anos aqui, enaltecendo o MM, só pq ele na retranca tirou meu time da quase B e nos deu dois títulos da CB com um futebol horroroso, se é que aquilo nós podemos chamar de futebol, ou serial MANOBOL?
      Pra poder ficar aqui a zoar os torcedores rivais, nós ficamos falando que o importante era os titulos, hoje, vemos o tamanho do buraco que o meu clube/time entrou, claro que ai tem prob. de diretoria etc, mas ha quanto tempo ver jogo do Cruzeiro nos dá prazer? ja nem sei qual foi o dia que jogamos bonito, e isto tudo caro amigo, vai contra as nossas tradiçoes, quisera ter um JESUS no meu time, cjhega de ABEL, MM, FELIPAO, LEVYR ETC.

      • Juliano Salvador disse:

        Hélio, quando o Abel era o técnico, o Flamengo ainda não tinha este time totalmente encorpado. Vou citar como exemplo o jogo Flamengo x Galo , onde o Galo venceu por 2 x 1 com Elias sendo expulso ainda no primeiro tempo. Jogaram Lincoln, Pará, Léo Duarte, Cuellar, Rodnei, Vitinho, Diego Barbantinho, que aliás entrou muito bem na final, mas são reservas hoje. Creio eu, nós só prestamos atenção nos ídolos, mas o sucesso do Flamengo passa pelas estreias de Rafinha, Pablo Mari, Felipe Luís e Gerson, ai os outros cresceram de produção e o consequente sucesso de todos, inclusive do Jesus. Temos que levar em consideração, adversário olha pra bola dentro da área, pênalti para o Flamengo, Arão mata jogada constantemente e pouco recebe o amarelo assim como outros defensores do Fla. Até hoje, só não entendi o porquê de 7 Câmara, Lásaro Cândido e Jesus se trancarem numa sala no dia do jogo Fla x Galo, embora eu ache que Jesus treinando o Galo seria um fracasso. Valeu amigo!