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E lá se foi o grande jornalista José Maria Rabelo

Tive o privilégio de aprender muito com ele. O conheci, junto com a família, pouco tempo depois da volta deles do exílio, em 1979. Me tornei amigo principalmente dos filhos Fernando (autor desta foto no dia em que ele tomou a primeira dose da vacina contra Covid, em fevereiro deste ano), Helinho e Ricardo. Conversar com ele era um prazer danado. Na convivência com eles passei a admirar Leonel Brizola e tive o prazer de ajudá-los a fundar o PDT em Minas.

 

É de autoria dele um dos melhores livros que já li: Diáspora os Longos Caminhos do Exílio, que escreveu junto com a esposa Thereza Rabelo, que pode ser adquirido na Estante Virtual (https://www.estantevirtual.com.br/livros/jose-maria-rabelo). Conta a trajetória deles, com sete filhos pequenos, no exílio na Bolívia, Chile e França.

Viveu intensamente, sem nunca abrir mão de suas convicções. Enciclopédia ambulante, precursor do “Google” em tanta informação. Bem humorado, mas duro na defesa do que é correto. Defendeu o jornalismo e a democracia até a morte, nesta madrugada.

Descanse em paz, guerreiro “Zé Maria”. Até um dia!

Mais detalhes sobre ele nesta reportagem do jornal Em Tempo:

“MORRE JOSÉ MARIA RABELO, AOS 93 ANOS, DEFENSOR DO JORNALISMO E DA DEMOCRACIA”

O jornalista José Maria Rabelo faleceu hoje de falência múltipla dos órgãos. Ele vai ser velado na Casa do Jornalista, hoje – dia 29/12 – de 14h às 20h.

Fundador do semanário Binômio, considerado um dos precursores da imprensa alternativa no Brasil, e exilado político por sua atividade jornalística, José Maria é natural de Campos Gerais, no Sul de Minas.

Com dois anos, perdeu a mãe e foi criado – ele e mais dez irmãos – pela madrasta Calypsa, que sempre o tratou como filho. Seu pai era dentista e quando os filhos ficaram um pouco maiores, ele resolveu mudar-se para Belo Horizonte, para que todos pudessem fazer faculdade. Nessa mudança, sua queda pela área de humanas já havia se concretizado.

Em Belo Horizonte, José Maria Rabelo vendia anúncios para uma publicação chamada Cultura Magazine, que era do ex-diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Washington Albino, que foi quem o levou para sua primeira experiência em uma redação de jornal. José Maria Rabelo foi trabalhar como repórter no “Informador Comercial”, publicação do jornalista José Costa que, em meados do século passado, iria transformar-se no “Diário do Comércio”. “Eu era muito empenhado na notícia”, afirmou José Maria Rabelo em entrevista ao site “Bafafa”, que é dirigido por seu filho, o também jornalista Ricardo Rabelo.

Binômio – No início dos anos de 1950, José Maria Rabelo ficou conhecendo o jornalista Euro Arantes, com quem fundaria o jornal “Binômio”, que circulou semanalmente, durante 12 anos, de 1952 a 1964. O “Binômio” era um jornal posicionado à esquerda e tinha como características mais marcantes a ironia, o sarcasmo e o bom humor. O próprio título do jornal era uma ironia ao então governador de Minas, Juscelino Kubitscheck, que tinha como lema de governo o binômio “energia e transporte”. O semanário foi considerado o precursor da imprensa alternativa e popular que ganharia força durante a ditadura. Nos anos de 1970, o Binômio seria equivalente ao semanário “Pasquim”, que também tinha a ironia e o sarcasmo como ingredientes principais.

Em 1961, o jornal foi literalmente destruído por cerca de 200 homens do Exército e da Aeronáutica. Tudo por conta de críticas feitas ao general João Punaro Blay, que foi designado pelo Exército para comandar a ID4, a maior unidade militar do Exército em Minas na época.

Em entrevista ao portal de notícias “Beltrano”, José Maria Rabelo contou que ao fazer um levantamento do passado do general, descobriu que ele havia sido interventor no Espírito Santo durante a ditadura de Getúlio Vargas e que durante sua gestão, ele agiu com truculência com os adversários, criando campo de concentração para os presos políticos e obrigando jornalista a engolir jornal, entre outras formas de violência.

Fiel ao espírito sarcástico do jornal, a reportagem tinha o seguinte título: “Funaro Blay, democrata hoje, fascista ontem”. José Maria Rabelo contou que dois dias depois da publicação da reportagem, o general foi ao jornal cobrar uma explicação. “Isso foi na segunda, e na quarta ele apareceu para falar comigo. Ele levava numa mão o jornal e na outra o barrete militar. Queria saber quem havia escrito ‘aquela merda’. Eu disse que era responsável por tudo que saía no jornal. Então ele me pegou pelo colarinho e eu reagi. Mas eu era judoca e o general levou uma desvantagem enorme na boca e saiu de lá com a roupa toda arrebentada. Mas continuava ameaçando, dizendo que não ia ficar assim. E não ficou mesmo. Três horas depois, 200 homens do Exército e da Aeronáutica comandados por seus respectivos comandantes, destruíram tudo”, afirmou o jornalista, que, com isso, foi obrigado a fugir de Belo Horizonte, indo, disfarçado de padre, para Poços de Caldas e, de lá, para São Paulo.

Ele só voltou para Belo Horizonte após a posse de João Goulart, para reestruturar o jornal, que circulou até 1964. Em 2014, as 801 edições do jornal foram digitalizadas pela biblioteca da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e estão disponíveis para consulta em https://bit.ly/3HfqxSO

José Maria em visita ao jornal “Estado de Minas” após voltar do exílio. Foto: Fernando Rabelo.

Exílio – Com o golpe militar, José Mara Rabelo, na época com sete filhos pequenos, foi para o exílio, tendo residido no Chile, onde criou uma rede de oito livrarias especializada em ciências sociais, e na França, onde se tornou novamente livreiro.

Em 1979, com a anistia, ele retornou ao Brasil. Com Leonel Brizola, participou da reorganização do antigo PTB, mas sem perder o vínculo com o jornalismo, escreveu dois livros. Um é “Os caminhos do exílio”(Geração Editorial, 2016), em que descreve como foram os anos em que passou exilado. O mais recente foi “A história geral de Minas”, lançado em dezembro de 2018, em parceria como o economista João Antônio de Paula, Fernando Correia Dias e Ricardo Moura Faria.

Em 2019, José Maria Rabelo participou, no Sindicato dos Jornalista de Minas, da abertura da série “Diálogos da Casa”, cujo objetivo era discutir temas importantes da atualidade. Rabelo falou sobre “Tendências da América Latina”, abordando desde os novos modelos de golpe, baseados na mídia e no poder judiciário, até os acontecimentos mais recentes na Argentina, Chile, Equador, Peru, Uruguai e Bolívia.

Na época com 91 anos, José Maria Rabelo mantinha o bom humor e otimismo, que sempre o caracterizaram. “Não é oba-oba não”, esclareceu, explicando que não era otimista porque estava querendo elevar o ânimo dos companheiros. “A tendência é a favor das forças progressistas, na América Latina e no mundo. A realidade é essa, não temos motivos para ficar deprimidos”, acrescentou.

“O mundo caminha para frente. Todas as forças latentes, apesar do momento de obscuridade, inclusive no Brasil, apontam para uma nova fase de afirmação dos sentimentos populares”, enfatizou Rabelo. “O problema é o que vamos fazer. Temos de procurar responder o que cabe a nós fazer com o poder”, observou o jornalista.

(Fonte Sjpmg.org)

https://m.jornalemtempo.com/noticia/morre-jose-maria-rabelo-aos-93-anos-defensor-do-jornalismo-e-da-democracia


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Comentários:
5
  • Julio Cesar disse:

    Quando eu estudava , acompanhei um evento na FAFICH em que ele debateu a história e Liberdade. Outros nomes como Alfredo Sirkis e outros estavam lá.

  • carlos henrique disse:

    Chico quando o Jose Maria Rabelo, vestiu de pedre e saiu de B.h.
    veio para poços de caldas e ficou escondido na casa dos meus parentes
    “familia Rabelo” meu bisavô era de Tres pontas Rabelo
    e tinha tambem Rabelo e campos gerais
    depois do exilio, os filhos vieram a Poços e encontraram a familia Rabelo
    vieram da França

  • Julio Firmino da Rocha Filho disse:

    Grande José Maria Rabêlo, um Jornalista – e Humanista – à frente do seu tempo! Como não recordar uma das mais impagáveis charges de que se tem notícia, veiculada pelo O Binômio, alusiva ao “crescimento de Belo Horizonte” nos anos 1950… Falar em José Maria é, também, recordar Leonel Brizola e grandes como Darcy, Abdias, Oscar e tantos outros. Vá em paz, Zé, que a família se mantenha firme. Bela homenagem, Chico.

  • carlos henrique disse:

    Chico você sabe , morei ate os 13 anos em B H..
    MAS, sou do sul de Minas,carlos henrique Rabelo
    com um l somente, como esse jornalista, Jose Maria Rabelo
    parente de meu avô, meu bisavô é de Tres Pontas
    Jose maria é de Campos Gerais grudado em Alfenas
    contam meus parentes, que quando a policia subiu
    num dos elevadores, do jornal Binomio, ele desceu por outro
    vestiu de padre e vei no sul de Minas, onde escondeu
    na casa de parentes meus,”familia Rabelo” e depois acho que foi para o Chile
    quando voltou encontrei uma vez com seus filhos em Poços de Caldas
    eu adorava o Brizola, e gostava do Jose maria Rabelo
    apesar de nunca o ter conhecido como meu avô
    que contava as historias
    Essas pessoas , Jose Maria Rabelo.Brizola, Darcy Ribeiro
    foram corajosos muito inteligentes
    e se no passado, Brizola tivesse sido presidente
    esse país , teria um povo educado, a prioridade, tanto de Brizola
    quanto de Darcy Ribeiro era a educaçao
    descanse em paz, Jose Maria Rabelo

  • Jerônimo disse:

    Que isso Chico Maia?!?

    Quer dizer que durante os anos de chumbo, na odiosa ditadura civil-militar brasileira, jornalistas foram perseguidos e muitos torturados ou mortos?
    Tem um psicopata, corrupto e negacionista (que ostenta uma faixa presidencial) que diz que nada disso aconteceu…que coisa, né?!?

    Infelizmente, a decadência das empresas jornalísticas atingiu fortemente, também, as empresas de comunicação de MG. As montanhas de Minas sempre produziram não só minério, mas também excelentes jornalistas.

    Hoje em dia, o sujeito tem um twitter, escreve umas bobagens e já se acha “jornalista”.
    Que dureza…