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Da agonia à glória: vinte anos atrás a seleção se sagrava penta Mundial no Japão

Eu nem estava me lembrando disso, mas agora há pouco recebi esta foto, do amigo, grande jornalista de São Paulo, cidadão do mundo, Fernando Valeika de Barros, com a seguinte frase: “Fui em busca da credencial de 2002 e achei essa bela recordação daquela noite inesquecível em Yokohama”.

O que é o futebol. Quase que a seleção nem estaria lá. Fazia uma péssima disputa de eliminatórias e corríamos o sério risco de ficar fora, pela primeira vez na história das Copas do Mundo. Ricardo Teixeira estava acuado no comando da CBF, enfrentando um bombardeio de denúncias da Rede Globo. Era questão de tempo para cair, renunciando ou sendo tirado pela justiça ou federações e clubes.

O sucesso ou fracasso do time na primeira Copa que seria disputada na Ásia e organizada por dois países, estava diretamente ligado à permanência ou não dele à frente do nosso futebol.

Mas ele é danado e agiu rápido e bem. Mandou o técnico Emerson Leão embora, tirou Felipão, o querido de todo o país, do Cruzeiro e deu carta branca para o homem trabalhar. Começava ali a “Família Scolari” e nessa toada a seleção se recuperou nas eliminatórias e seguiu seu destino.

Felipão apostou na recuperação de Ronaldo “Fenômeno” que tinha passado por gravíssima cirurgia no joelho, aguentou uma pressão absurda de todo o país, para convocar Romário, buscou jogadores pouco cotados na época, como Gilberto Silva (Atlético), Kleberson (Atlético/PR), Luizão e Anderson Polga (Grêmio).

No primeiro jogo, contou com um pênalti que não existiu e venceu a Turquia por 2 x 1. Nas oitavas contou com outro erro da arbitragem, que anulou um gol legítimo da Bélgica, quando o jogo estava apertadíssimo, e venceu por 2 a 0. Na final, o então melhor goleiro do mundo, Khan, soltou uma bola infantil nos pés do Ronaldo que abriu o placar, aos 22 do segundo tempo. Aos 34, de novo Ronaldo, que ampliou e definiu o placar: Brasil 2 x 0 Alemanha.

Além de competente e determinado, Luiz Felipe Scolari administrou situações delicadas no percurso até o título, que segurou Ricardo Teixeira no poder por mais 10 anos, quando foi obrigado a renunciar e passar a bola para o Marco Polo Del Nero.

Faltando 24 horas para a estreia, em Ulsan, contra a Turquia, o capitão do time, volante Emerson, machucou o ombro, jogando como goleiro num rachão e teve de ser cortado. Era chegado o momento de Gilberto Silva entrar para a história.

Emerson nunca o perdoou e em 2014, pouco antes da Copa no Brasil, disse o seguinte para o jornal Zero Hora:

__ “Me tratou como um qualquer”

 

Havia a necessidade do corte?
Tive uma decepção muito grande com o Felipão. Nunca mais falei com ele depois daquilo. Ele diz que foi o dia mais difícil da vida dele, quando me cortou em 2002. Sempre fala isso, mas não me tratou com esta importância. Fui cortado pelo David Coimbra.

Como assim, cortado pelo David Coimbra?
O David ligou para o meu quarto e disse que eu estava cortado. Eu não sabia de nada. Fiquei chocado. Pensei até que o David estava querendo se promover em cima de mim. Como assim cortado? Nem sequer havia ocorrido a reunião com a comissão técnica. Eu era o capitão do time. Não podia ser verdade.

Mas era…
Era. E isso me frustrou. Felipão dizia que eu era da confiança dele. Me ligava de madrugada, dizendo que, no Rio, a torcida queria virar o carro dele porque não convocou o Romário. Ele desabafava comigo, eu era o confidente dele. Sinceramente, não sei se teria tempo de me recuperar em meio à Copa, mas a Inglaterra manteve o Beckham (cortado da Copa de 2010, por lesão, o meia foi convidado a permanecer com a seleção durante a campanha na África do Sul), por respeito. Felipão não precisava ter me cortado. Sempre estive presente quando ele precisou de mim. Quando eu precisei, ele me faltou.

Mas quando foi que você recebeu a notícia oficial do corte, da boca do Felipão?
Nunca. Runco (o médico da Seleção José Luiz Runco) foi quem me informou do corte. Disse que era uma lesão que demoraria para curar, por ser a minha primeira de ombro.

Você e Felipão nunca mais conversaram sobre o corte de 2002?
Nunca mais. Nem sobre isso, nem sobre nada. E nem tenho interesse em voltar a falar com ele. Só não quero mais ouvir Felipão dizendo que foi difícil para ele. Se foi tão difícil assim, por que não tratou como tal? E tudo o que passei depois daquilo? O meu drama pessoal? Subi com ele no Grêmio, em 1994. Não posso escutar isso e ficar quieto. Mas, para mim, isso já está resolvido. Ele poderia ao menos ter dito: “Olha, não tive escolha”. Mas nem isso houve. Nunca aconteceu esse olho no olho. Logo, eu não poderia mais ser a pessoa de confiança dele. Não assim, desta maneira…

***

Interessante é que na Copa anterior, Emerson foi chamado de última hora para estar no time do Zagalo, na França 1998, e nesta mesma entrevista ao Zero Hora o fato é lembrado:

Na Copa de 1998, você não havia sido convocado por Zagallo para a Copa, mas, com o corte de Romário (lesão muscular), já na França, você foi chamado às pressas. Em 2002, ocorreu o contrário: você era o capitão da Seleção e acabou cortado na véspera. Você viveu os dois lados dessa “lista de espera”.
Em 1998, não existia pré-lista. Fui pego de surpresa. Estava de férias do Bayer Leverkusen (Emerson atuou ainda pela Roma, Juventus, Real Madrid, Milan e Santos) e preparando as malas para passar uns dias com a família em Fortaleza. Quando ligaram da CBF, pensei que era brincadeira. Eu tinha 20, 21 anos, e imaginei que alguém estava de sacanagem comigo. Era verdade. Comprei meu primeiro terno e entrei no avião. Em 2002, era o capitão. Um dia antes da estreia, fui cortado. Ou seja: fui surpreendido duas vezes

* *  *

A ficha da final em Yokohama, cidade que fica perto de Tóquio:

BRASIL (2): Marcos; Lúcio, Edmílson e Roque Júnior; Cafu, Gilberto Silva, Kléberson, Ronaldinho (Juninho Paulista, 40/2ºT) e Roberto Carlos; Ronaldo (Denílson, 45/2ºT) e Rivaldo.
Técnico: Luiz Felipe Scolari

ALEMANHA (0): Kahn; Linke, Ramelow e Metzelder; Schneider, Jeremies (Asamoah, 32/2ºT), Hamann, Frings e Bode (Ziege, 39/2ºT); Neuville e Klose (Bierhoff, 29/2ºT). Técnico: Rudi Völler

Gols: Ronaldo (B), aos 22 e aos 34 minutos do 2º tempo
Cartões amarelos: Roque Júnior (B); Klose (A)
Árbitro: Pierluigi Colina (Itália)
Local: Estádio Internacional de Yokohama, em Yokohama, no Japão
Público: 69.029

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A entrevista completa do Emerson ao Zero Hora:

https://gauchazh.clicrbs.com.br/esportes/copa-2014/noticia/2014/05/emerson-sobre-corte-em-2002-me-tratou-como-um-qualquer-ckazex35u003v015n3ikgu0p6.html


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Comentários:
7
  • cristiano marques disse:

    Luizão foi fundamental na classificação pelas eliminatórias para a Copa.
    Ele e Edilson.

  • Eduardo Silva disse:

    Esse negócio de eleição de Melhor Torcida é assim mesmo, são escolhidas daqueles times que são os campeões das copas e campeonatos. Também os artilheiros dos times vencedores, melhor técnico, roupeiro, cartola, gandula…

    Ano que vem a do Cruzeiro deve ser eleita porque está lotando o Mineirão (Toca 3) em todos os jogos e canta e empurra o time o jogo inteiro, até quando perde a torcida apoia, fora a coreografia com os jogadores ao final dos jogos que é épica!

    Nesse ano a.CHINA AZUL tá sobrando! Não tem pra ninguém!

  • Jerônimo disse:

    Em 2002, a seleção brasileira que ganhou a Copa tinha 13 jogadores que atuavam no Brasil e 10 que jogavam no exterior.

    Em 2022, a seleção brasileira que perderá a Copa terá, talvez, dois jogadores que atuam no Brasil (Hulk e Arana) e 24 ou 25 jogadores que atuam no exterior.
    Essa seleção do Tite é de baixa estatura, fraca fisicamente e muito leve.
    Vai tomar um sacode…

    Eu até entendo o corte do Emerson, mas a convocação do Ricardinho e não do Alex10 não tem explicação. O Felipão só chegou à seleção pelo o que o Alex fez para ele no Palmeiras.

  • Luiz Ibirité disse:

    Nem vivendo os dois lados da moeda o cidadão deixa a arrogância, já havia ido em uma copa, quantos terão a oportunidade? Paciência, é o mau do ser humano, não compreende, quer houvir justificativa pra tudo. Quanto as suas lembranças caro Chico, devem ser muitas e vc já pode pensando aí em escrever um livro, histórias não vão faltar.

  • Raul Otávio da Silva Pereira disse:

    Quem é Emerson na fila do pão mesmo ?

    Vai ter que entrar na fila dos injustiçados, que tem Ademir da Guia, Dirceu Lopes, Reinaldo e muitos outros antes dele.

    • Ed Diogo disse:

      Resposta certíssima Raul , um cabeies área que não fez falta na seleção, Gilberto Silva foi muito melhor que ele . Só do Reinaldo estar nesta fila ele não tem direito de reclamar de nada .