Conheço muita gente que jogou a toalha para a política há muitos anos, por pura desilusão, e este sentimento está se transferindo cada vez mais também para o futebol. Volta e meia tenho informações de mais gente que se retira do mundo da bola, total ou parcialmente, por causa de motivos semelhantes aos da política: armações, suspeições, ladroagem explícita, falta de provas, impunidade, raras punições a um ou outro e, no fim, a surrada frase: “no Brasil é isso mesmo!”.
Hoje, aqui no blog, um dos comentaristas mais tradicionais, assíduos e sensatos deste espaço, a quem tive o prazer de conhecer pessoalmente anos atrás, fez um “desabafo e despedida”. Lá se foi o Raws Miranda, pelo menos por um tempo, segundo ele, e tomara que não demore muito a voltar. Em 2013, foi o Luciano Orlando, um amigo diamantinense, dentista, apaixonado pelo Galo e por futebol. Largou pra valer. Não por causa do Atlético, que lhe dera naquele ano a maior alegria, mas por causa da Portuguesa, rebaixada no tapetão, depois de uma jogada escusa de bastidores que jamais será desvendada, e se algum dia for, não renderá punição a ninguém.
Luciano nunca torceu pela Lusa, mas ficou indignado com a sujeira com ela.
“Não aguento essas coisas mais; futebol não é pra mim; estou fora. Nem jogo do Galo assisto mais”, disse e cumpriu. Ficou sabendo que o Atlético foi campeão da Copa do Brasil sobre o Cruzeiro alguns dias depois, já que viajou na época e não se preocupou em se informar onde estava.
No dia 10 de agosto de 1981, no Aeroporto Santa Genoveva, em Goiânia, João Saldanha sentou-se numa cadeira entre eu e o Vilibaldo Alves, que junto do Flávio Anselmo, Paulo Roberto Pinto Coelho e outros companheiros aguardávamos o voo para Belo Horizonte. O então comentarista de maior audiência e prestígio do Brasil, me perguntou:
__ Qual a sua idade, meu filho?
__ 20 seu João!
__ Se eu fosse você escolhia uma outra profissão porque o futebol está acabando e o jornalismo morreu.
Diante do espanto de todos nós pela força da frase e da seriedade do semblante da fera, ele continuou:
__ Isso não existe; o que o Whight fez ontem foi o maior absurdo que já vi na minha vida. Não foi só com o Atlético, foi uma paulada no futebol brasileiro, na credibilidade das instituições. No futuro, ninguém vai querer saber mais de futebol; isso aqui foi o começo do fim.
João Saldanha era comentarista da Rádio Globo, do Rio, e indignado com o que o José Roberto Wright tinha feito na noite anterior, Atlético x Flamengo, quem passaria à fase seguinte da Libertadores da América. Acabou com o jogo aos 37 minutos, depois de expulsar Éder, Reinaldo, Chicão, Palhinha e Cerezo, sendo Reinaldo por causa de uma falta em Zico, sem violência, ainda no meio de campo e sem cartão amarelo antes.
Pensei muito no que o Saldanha me disse. Meu pai queria que eu me formasse em Direito, Agronomia ou seguisse carreira militar. Optei pelo Direito, mas sem parar de trabalhar. Era um prazer pertencer àquela equipe fantástica da Rádio Capital, cobrir o Atlético e ganhar um ótimo salário, desses que nunca mais o rádio mineiro pagou.
Anos depois, fazendo estágio na área criminal do Direito, confirmei aquilo que foi se formando em minha cabeça durante o curso: é um mundo mais perverso e falso que o jornalismo. Formei, passei no exame da OAB e para chateação do meu pai, disse a ele que aquilo não era pra mim.
As previsões do saudoso João não se concretizaram. O futebol continuou arrastando multidões, movimentando bilhões e as armações as mesmas. Depois daquela noite de agosto de 1981 vi incontáveis novos “Serra Dourada”, contra o Atlético, Cruzeiro, Internacional, Grêmio, América, Bahia, Sport e até contra os grandes do Rio e São Paulo também, porém, entre eles.
Política, já larguei há tempos; futebol, ainda não, pois trabalho com ele. Nasci no Brasil e já passei da idade de tentar a vida lá fora.
Em compensação estou tendo a satisfação de ver um ex-presidente da CBF preso. Um sujeito que chegou a ser governador de São Paulo. O antecessor dele, Ricardo Teixeira, está acuado, e como diria Nelson Rodrigues, “caçado a pauladas feito uma ratazana prenhe”. O sucessor, Del Nero, não sai do país, por medo de também ser preso. Na política, “nunca antes na história desse país” se prendeu tantos políticos e empresários de grosso calibre. É um fio de esperança de um futuro melhor no que se refere a honestidade!
Agora, não pode é torcedor se deixar possuir pelo complexo de perseguição e achar que só as arbitragens são responsáveis pela perda de pontos absurdos do time dele! Não enxergar as próprias deficiências é não querer aceitar a realidade. Melhor aceitar; dói menos!
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