O comentarista Silvio T., sugeriu mais postagens sobre treinadores de futebol, e então vamos lá. Sou desses que valorizam a categoria. Tem gente que acha que eles não têm tanta importância assim. Há uma corrente que diz: “treinador não ganha jogo, mas perde”. Levir Culpi escreveu até um livro, cujo título saiu de um xingamento que ele sofreu à beira do gramado: “Burro com sorte”. Aliás, este é dos melhores que já tive o prazer de ver trabalhar. Daqueles que conseguem montar times competitivos com jogadores apenas dedicados, sem talento acima da média. Para mim o maior erro do Daniel Nepomuceno como presidente do Atlético foi tê-lo desprezado. Depois, passou o mandato inteiro tentando um substituto que mantivesse o Galo no patamar de títulos e competitividade, mas, em vão.
Levir pode ser encaixado da categoria dos “milagreiros” e me lembrei dele ao ler esta ótima análise feita pelo Martín Fernandes, no O Globo, sobre um dos maiores “milagreiros” do futebol mundial. Confira:
* “Wenger, o milagreiro”
Se a Premier League é hoje o melhor campeonato nacional do mundo, deve muito ao francês
David Dein era dirigente do Arsenal, nos primeiros tempos de Arsène Wenger no clube londrino, quando precisou fazer o check-in do técnico num hotel. Ao preencher o campo “profissão”, escreveu lá: “Milagreiro”. A história foi contada por Amy Lawrence no jornal britânico “The Guardian” ontem, tão logo Wenger anunciou sua saída do Arsenal depois de 22 anos.
Wenger de fato fez milagres. Antes de conquistar títulos, precisou vencer as desconfianças que brotavam de todos os lados — dentro do vestiário que ele comandava, na imprensa, entre os colegas de profissão. Um técnico francês, vindo de um clube japonês, chamado para resgatar da irrelevância um dos mais tradicionais clubes ingleses. Foi um choque em 1996. Se hoje parece fácil, é por causa dele.
Ao desembarcar em Londres, Wenger foi recebido a pedradas pelos tabloides — “Arsène quem?” — e pelo então técnico do Manchester United, Alex Ferguson: “Dizem que é um homem inteligente, certo? Fala cinco línguas? Bom, tenho um garoto de 15 anos da Costa do Marfim que também fala cinco línguas”.
Nunca mais ninguém ouviu falar do tal garoto marfinense, mas o time do Arsenal tomou a coroa do United de Ferguson em 1997/98 e fez de Wenger o primeiro estrangeiro a conquistar o Campeonato Inglês. Começava ali a rivalidade entre o francês refinado e o escocês turrão que virou até documentário na Inglaterra. Para Felipão, único brasileiro a dirigir um time na Inglaterra, Arsène Wenger é “íntegro, correto com os colegas, exigente com suas equipes”.
Em “Febre de bola”, talvez o melhor livro já escrito sobre futebol, o escritor Nick Hornby narra como sua vida foi toda pautada pela obsessão pelo Arsenal. O livro foi publicado em 1992, auge do “boring Arsenal”, fama que seria enterrada nos anos seguintes pelas ideias arejadas e pelo futebol ofensivo praticado pelos jovens talentos trazidos do exterior por Wenger — Bergkamp, Henry, Gilberto Silva, Vieira, Fabregas, uma longa lista.
Vinte anos depois, num prefácio a uma edição comemorativa do livro, Hornby constatou a mudança: “Meu time, antes sisudo e antipático, de repente se tornou sinônimo de perfeição estética, desfrutando aquele que foi, possivelmente, o melhor período de sua história; durante alguns anos desconcertantes, entre 1997 e 2006, pude ver de perto, sábado sim, outro, não, vários dos melhores jogadores do mundo”.
Wenger perdeu várias oportunidades de deixar o Arsenal nos últimos dez anos, quando o time deixou de competir por títulos. Em 2008, por exemplo, foi cotado para substituir Frank Rijkaard no Barcelona. O clube catalão resolveu apostar num jovem de 37 anos que vinha do time B.
Pep Guardiola estreou com uma derrota para o Numancia e emendou um empate em casa ante o Racing Santander. Como escreveu o inglês Graham Hunter em “Barça”, livraço que a editora Grande Área acaba de traduzir para o português, os jornais — termômetro de uma época pré-redes sociais — foram inundados por cartas em tom furioso. Um dos pedidos da torcida era a contratação imediata do russo Arshavin, então craque do… Arsenal de Wenger.
Guardiola seguiu em frente. Ganhou seis títulos naquela temporada, outros tantos nas seguintes com Barcelona e Bayern de Munique até finalmente chegar ao Manchester City. Hoje, o campeão inglês é um técnico espanhol, Guardiola. Antes dele, dois italianos, Conte e Ranieri, um português, Mourinho, e um chileno, Pellegrini. Tal diversidade só pode ser saudável. A culpa é de Wenger.
https://oglobo.globo.com/esportes/wenger-milagreiro-22615334#ixzz5DasPgEZo
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