De todos os escândalos envolvendo as construções e reformas de estádios para a Copa de 2014, o Maracanã está no topo da lista. Verba pública enriquecendo muita gente ilicitamente desde os preparativos para os Jogos Pan-Americanos de 2007, culminando na Olimpíada do ano passado.
Agora, está abandonado, mesmo com a determinação judicial, semana passada, para que a concessionária Maracanã S.A., liderada pela construtora Odebrecht, reassuma a operação e manutenção do estádio. Menos mal que um dos maiores beneficiados, o ex-governador Sérgio Cabral, está preso, mas o prejuízo público é monstruoso, irrecuperável.
Ruy Castro escreveu esta interessante coluna sobre no assunto na Folha de S. Paulo dia desses:
* “Memória demolida”
Fechado, sem dono e saqueado, o Maracanã se desmancha às nossas vistas. Gramado, túneis, vestiários, salas, vidros, esquadrias, tudo destruído. Sumiram fiações, computadores, extintores, mangueiras, milhares de cadeiras e, para completar, o busto de Mario Filho — o jornalista cuja campanha foi decisiva para a existência do Maracanã e que, desde sua morte em 1966, honrava-o com seu nome.
Talvez haja aí um componente simbólico: que bom que nem em busto Mario Filho esteja lá para ver o que fizeram com seu estádio. E, assim como ele, tantos outros que escreveram tão bem sobre futebol: seu irmão Nelson Rodrigues, João Saldanha, Sandro Moreyra, Armando Nogueira, Ney Bianchi, Achilles Chirol, Sergio Porto. Todos, em algum momento, cronistas do Maracanã. Nenhum deles, hoje, entre nós.
Mas há um jornalista ainda vivo e que teria ainda mais motivos para sofrer com o estupro a que submeteram o estádio: Sérgio Cabral, historiador do Carnaval e da música brasileira e vascaíno histórico. A partir de 1950, nos degraus do Maracanã, ele viu Ademir, Ipojucan, Pinga, Vavá, Roberto, Romário e Edmundo levarem o Vasco a muitas conquistas.
Às vésperas dos 80 anos, dos quais abençoado há três por uma forma irreversível de demência senil, ele parece não saber muito bem das acusações que pesam sobre seu filho e homônimo, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral.
Em sete anos de Sérgio filho à frente do Estado (2007-14), o Maracanã foi derrubado e reconstruído tantas vezes em nome da Copa, do Pan e da Olimpíada que perdemos a conta. Conta esta que a Odebrecht sempre teve de manter em dia, para pagar as supercomissões que, segundo as delações, ele levava. O fato é que, em cada metro de cimento do Maraca que Sérgio filho mandou quebrar, uma parte da memória de Sérgio pai também se esfacelou.