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No Brasil, raramente alguém está alheio ao futebol, possivelmente a única fonte de igualdade social neste país sacana com os seus habitantes. Junta no mesmo balaio, do mais pobre ao mais rico, do mais correto cidadão ao ladrão, pretos, brancos, amarelos, cafuzos, pardos, mamelucos, índios, ateus, agnósticos, religiosos fervorosos, árabes, judeus e seja mais o que for. Por isso é que vale a frase para explicar um pouco o futebol: “tem que respeitar”!
No jornal O Tempo de hoje, perfil muito bem contado do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, pelo Lucas Ragazzi.
* “De gandula a dono da bola: Maia é peça-chave no futuro Temer”
Tímido e pouco afeito aos estudos, Rodrigo Maia (DEM-RJ) entrou na política após fugir de um atentado
De primeira, em belo voleio com a perna esquerda, Romerito empata a partida no Maracanã: Brasil, 1; Paraguai, 1. Válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo do México de 1986, o jogo, realizado em junho de 1985, acendia o sinal vermelho na seleção brasileira. Com problemas de vestiário e perigando não se classificar, a equipe de Zico, Sócrates, Cerezo e Éder, treinada por Telê Santana, deixava o campo vaiada. Naquela tarde, também em campo, sofrendo com o resultado, estava Rodrigo, 15 anos. Diferente dos outros gandulas, normalmente vindos de favelas e escolinhas de futebol da região, ele é filho do então secretário de Fazenda do governo do Rio de Janeiro, Cesar Maia.
Fanático pelo Botafogo, Rodrigo, tímido, não levava jeito com esportes, mas aproveitava a influência do parente para se incluir no meio e acompanhar, de perto, os ídolos. Trinta e dois anos depois, o futebol continua presente na vida do hoje presidente da Câmara Federal, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), apelidado de “Botafogo” pelos executivos da Odebrecht em supostos repasses de caixa 2 da empresa.
A ajuda do pai para alçar voos maiores também permaneceu. Cesar e Rodrigo se falam todo dia – normalmente, mais de uma vez. “Eles são muito apegados. Rodrigo consulta o pai para quase tudo, pede opinião sobre manobras e alianças em Brasília, eles falam de questões pessoais. Apesar disso, odeia quando insinuam que é somente um fantoche do Cesar”, conta uma assessora próxima da família. “Uma vez, o Rodrigo brigou com um vereador do Rio porque foi alfinetado dizendo que faz tudo para buscar a aprovação do pai. Fez uma cena e tanto”, lembra a assessora.
Rodrigo Maia nasceu na capital chilena, Santiago, em 1970. Dois anos antes, Cesar Maia havia sido preso pela ditadura militar durante congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna, no interior de São Paulo. Articulista do PCB e com amizades na guerrilha, precisou se exilar no país andino. Por lá, conheceu a estudante Mariangeles Ibarra, com quem viria a se casar e ter um casal de gêmeos.
Mariangeles costuma ser definida por pessoas próximas como uma mãe “superprotetora”. O desentendimento entre Rodrigo Maia e o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (PMDB), inclusive, se deu, em parte, por influência dela. “Paes e Rodrigo eram amigos, andavam sempre juntos em Brasília. Mas o Paes passou a se destacar mais e conseguiu apoio para a prefeitura. Isso irritou a Mariangeles. Ela queria que apagassem o brilho do Paes”, diz uma fonte. A irmã, Daniela Maia, empresária, é casada com um sócio do banqueiro Daniel Dantas.
Dedicação
Jovem pouco apegado aos estudos, Rodrigo Maia cresceu dentro dos condomínios fechados da Barra da Tijuca. Por vezes, era levado pelo pai para conversar com o então governador Leonel Brizola.
Ingressou, aos 20, no curso de economia em uma faculdade particular do Rio. Deixou as salas de aula pouco tempo depois e, mesmo sem diploma, passou a atuar como diretor financeiro em bancos privados. Um atentado criminoso, no entanto, causou uma reviravolta na vida de “Botafogo”.
Em 1996, a polícia descobriu um esquema de correspondência entre criminosos, de dentro de um presídio, que detalhava todos os passos do cotidiano de Rodrigo – na época, seu pai ocupava a prefeitura.
“Chegaram a seguir e atirar contra o carro dele, mas não sei se foi descoberto quem estava por trás disso”, diz o amigo da família José de La Peña, ex-diretor de campanhas.
Por conta do ataque, Rodrigo mudou-se para Nova York. Passou dez meses nos Estados Unidos, onde estudou finanças em um curso privado. “Lá, ele entendeu com maior profundidade os méritos da economia de mercado”, garante o pai.
Na volta ao Brasil, entrou de vez para o meio político: assumiu a Secretaria Municipal de Governo na administração de Luiz Paulo Conde (PFL). A partir disso, não teve volta. Em 1998, Rodrigo candidatou-se pela primeira vez à Câmara Federal. “Foi uma ideia dele mesmo, até porque, na época, fui contra a candidatura dele”, explica Cesar Maia.
Articulador nato para o pai, despreparado para a oposição
Para o ex-prefeito do Rio de Janeiro Cesar Maia, pai do presidente da Câmara, Rodrigo Maia desenvolveu, na política, características muito diferentes das dele: “Ele tem uma capacidade notável de articulação, de diálogo e de ouvir. É algo que não tenho”. A opinião é compartilhada pelo amigo José de La Peña. “Cesar sempre foi mais explosivo, mais difícil de tratar”, diz.
Na avaliação de um deputado de oposição, que pediu para não ser identificado, no entanto, Maia é despreparado tanto intelectualmente quanto emocionalmente. “A presidência dele na Câmara é uma bagunça, as coisas são tratadas quase que na total informalidade”, dispara o parlamentar.
Certa vez, conta o deputado em anonimato, Maia quase foi às lágrimas durante bate-boca com membros da bancada gaúcha por conta de uma medida provisória: “Você percebe que há uma infantilidade ali. Ele embarga a voz quando confrontado, fecha a cara, quase chora, mesmo”.
Apesar disso, Maia tem sido elogiado pelas lideranças por ter revogado medidas adotadas pelo ex-presidente da Casa Eduardo Cunha. Com a mesma timidez da adolescência, ele não é de tanta conversa em cerimônias e jantares. Atualmente, tem adotado uma marca de cerveja artesanal carioca como bebida favorita, sempre servida a quem o visita em Brasília.
Como em outros momentos, a biografia do pai também ajudou Maia a se tornar presidente nacional do Democratas. Carregando a herança de ser um partido “herdeiro” do PFL, ex-ARENA, legenda política da ditadura, o grupo viu, em 2007, a chance de diminuir os estragos por conta deste histórico: eleger o filho de um perseguido pelos militares. (LR)
Aliança velada com esquerda deu poder
Entre os diversos episódios que ocorreram até a chegada de Maia à presidência da Câmara, o apoio de siglas de esquerda a seu nome é, sem dúvida, um dos mais curiosos. Durante as articulações do pleito, ele contou com a ajuda do amigo pessoal Aldo Rebelo, comunista de raiz e ex-ministro de Dilma Rousseff.
“O fato de o Cesar Maia ter uma história na esquerda e conhecer essa ala mais radical facilitou o contato do Rodrigo. É difícil classificar algum deputado de esquerda que tenha inimizade com ele”, diz um deputado de oposição.
Nas últimas semanas, Maia tem-se movimentado contra Temer. Pressionado por instituições financeiras, o presidente da Câmara tenta viabilizar uma “saída honrosa”, sem estardalhaços, de Temer da Presidência. Se houver uma renúncia, Rodrigo assume a cadeira do Executivo por um mês, antes de convocar eleições indiretas. Se Temer for afastado, o presidente da Câmara assumiria por pelo menos seis meses.
Ele nega negociações para substituir Temer. Cesar Maia, no entanto, deixa o futuro do filho no ar: “Antônio Carlos Magalhães costumava dizer que o político pode construir uma carreira em direção ao Legislativo e aos Executivos municipal e estadual. A Presidência da República, porém, é matéria do destino”. (LR)
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