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O modelo francês de estádio que deveria ter sido pelo menos consultado pelo Brasil

Uma ótima reportagem do O Globo sobre o Stade de France, cuja concepção e gestão deveriam ter sido pelo menos consultada pelos governantes brasileiros antes do início das obras de construção de estádios aqui para a Copa de 2014.

Mas do jeito que foi feito lá, as dificuldades para alguém ganhar dinheiro ilicitamente, eram enormes e o interesse público prevaleceu e prevalece.

No Brasil, obras muito mais caras, do projeto à execução e as polêmicas país afora que temos visto.

Diferente do novo Mineirão, por exemplo, que quer que as torcidas do Cruzeiro e Atlético paguem a conta, lá, o futebol é o que menos conta no Stade de France.

Confira:

* “O estádio que esnoba o futebol”

Stade de France fatura quase 100 milhões de euros por ano apostando na diversidade de eventos

Stade-de-France-2

Como você chamaria um estádio construído para uma Copa do Mundo que, após o evento, passa a receber, em média, seis jogos de futebol por ano? A resposta certa poderia ser ‘elefante branco’ se não estivéssemos tratando do Stade de France, palco da (para nós) indigesta decisão do Mundial de 1998, aquela do piripaque de Ronaldo na concentração e dos dois gols de Zidane que construíram a vitória por 3 a 0 sobre o Brasil na maior conquista da história esportiva da França.

Quinze anos depois, o estádio em Saint-Denis, município ao norte de Paris, se transformou em um dos mais bem sucedidos exemplos de arena multiuso da atualidade. Futebol? É o que menos se vê naquele gramado. Sem ser a casa de qualquer time da cidade – o Paris Saint-Germain, por exemplo, nunca deixou de mandar suas partidas no Parc des Princes -, o Stade de France esbanja saúde financeira apostando na variedade de atrações, especialmente jogos da seleção de rúgbi – outro esporte muito popular no país – e shows internacionais, além de eventos de atletismo e todo o tipo atrações esportivas, como corrida de cavalo, provas de automobilismo, vôlei de praia e até windsurfe. Só de visitantes, são 100 mil por ano.

O futebol responde por apenas 25% da programação anual: por contrato, a Federação Francesa de Futebol é obrigada a organizar um mínimo de seis partidas no local por temporada, a maioria da seleção do país. Clubes só jogam lá em duas ocasiões, nas decisões da Copa da Liga Francesa e da Copa da França.

– Existem elefantes brancos em Atenas, Pequim e na África do Sul. Aqui, resolvemos apostar em várias atividades, incluindo encontros de negócios e turismo – explica o gerente de marketing do estádio, Matthieu Barnay, referindo-se ao legado de prejuízo deixado por alguns equipamentos construídos para os Jogos Olímpicos de 2004, 2008 e a Copa do Mundo de 2010, respectivamente.

Na semana passada, foi lançado no Rio o edital de concessão, operação e manutenção do Complexo do Maracanã. A licitação será no dia 11 de abril e o processo será realizado pelo sistema de Parceria Público-Privada (PPP). Informações sobre o modelo de gestão, no entanto, ainda não foram divulgados.

  • Estádio receberá a final da Euro 2016

Único certificado pela Uefa com o selo de estádio cinco estrelas no país, o Stade de France já recebeu alguns dos maiores eventos esportivos da Europa nos últimos anos. Além da final da Copa de 98, a arena foi palco das decisões de duas Ligas dos Campeões da Europa (2000 e 2006), dos Mundiais de Atletismo-2003 e de de Rugbi-2007. Naquele gramado também será realizada a final da Eurocopa 2016, que a França sediará. Grandes nomes da música internacional também já montaram seu palco por lá, como U2, Rolling Stones, Black Eyed Peas, AC/DC e Lady Gaga, responsável pelo 50º concerto do estádio.

O palco da decisão do Mundial de 98 foi construído em dois anos e sete meses – o tempo previsto para a reforma do Maracanã, por exemplo -, ao custo de 364 milhões de euros, sendo 52% pagos pelo Estado e os outros 48% pelo Consortium Stade de France, formado pelas empresas Vinci, de construção civil, detentora de 2/3 das ações, e Bouygues, de telecomunicações. Em julho deste ano, os administradores preveem pagar a última parcela do empréstimo tomado junto a um banco privado para a construção do estádio. A comemoração pelo aniversário do título mundial, conquistado no dia 12 de julho de 1998, eles deixam para a torcida. O que importa para os gestores é que, quinze anos após a Copa, a arena multiuso já está quitada, e o que vier a partir de agora é lucro.

E que lucro: o balanço de 2012 aponta 95 milhões de euros em faturamento. Os gastos não são revelados, mas o consórcio garante que o estádio jamais registrou déficit ao fim de cada temporada de muito rugbi, shows de rock, óperas e, sim, algum futebol. Pelo contrato de concessão, o governo francês recebe anualmente uma parte da receita, que pode chegar até 50%.

– Desde 1998, tivemos a política da diversificação: óperas, espetáculos equestres, grandes eventos esportivos. Entre 2011 e 2012, o rúgbi levou 650 mil torcedores ao estádio, com uma taxa de ocupação de 81%. No mesmo período, foram 520 mil torcedores em jogos de futebol, menos apenas que os estádios do PSG, Lyon e Olympique de Marselha. Em oito shows, sendo três deles internacionais, 527 mil pessoas vieram ao estádio. E mais de 300 mil assistiram às seis óperas apresentadas aqui – resume Barnay.

  • Esquecido pelo Brasil

Com três níveis de arquibancada, 173 camarotes para 2.836 privilegiados, 20 salões – que são usados também para encontros corporativos e podem abrigar 6 mil pessoas -, tribuna de imprensa com 500 lugares, 40 bares e dois restaurantes, o Stade de France pode receber 80 mil torcedores, quase a população de Saint-Denis. O anel inferior, que repousa sobre a pista de atletismo, é retrátil: quando preciso, seja para competições ou entretenimento, o setor é rebaixado e empurrado para baixo da arquibancada central, numa operação que dura cinco dias. Em dias de show, a capacidade aumenta para 96.540 pessoas. Desde a sua fundação, mais de 24 milhões de franceses e turistas de todo o mundo já passaram pela arena em 335 eventos. Para 2013, estão previstas entre 25 e 27 atividades.

O aniversário de 15 anos, porém, pode marcar a primeira prova de fogo para os gestores. Um dos pilares da sustentabilidade do Stade de France, o rúgbi está pensando em ter sua própria casa: existe um projeto de construção de um estádio exclusivo para a seleção nacional até 2018. E o contrato atual com a federação terminará justamente em junho deste ano. Atualmente, o esporte da bola oval é responsável por quase a metade da ocupação do local, com até 11 jogos por ano, contra um mínimo de seis partidas de futebol e apenas um meeting de atletismo no mesmo período. Para tranquilidade dos gestores, a Federação Francesa de Futebol já renovou seu contrato, em 2010, por mais 15 anos.

O consórcio que administra o Stade de France se orgulha de ter praticamente inventado um modelo próprio de geração de renda na Europa. E de servir de exemplo para outras praças esportivas. O sucesso da arena parisiense, porém, parece não ter sido suficiente para superar os 9.500 km que separam a França do Brasil. Segundo Barnay, o país que está reformando ou construindo 12 estádios para a próxima Copa do Mundo jamais enviou um representante para conhecer o modelo francês:

– Trabalhamos antes de 2010 com pessoas ligadas à Copa da África do Sul, e já colaboramos com muitos estádios da Europa. Do Brasil, nunca fomos procurados por ninguém. Mas sabemos que existem outros modelos. Na Ásia, por exemplo, existe um aproveitamento mais ligado à comunidade. Para dizer qual seria o modelo melhor para o Brasil, somente conhecendo a realidade brasileira – avalia Barnay.

* http://oglobo.globo.com/esportes/o-estadio-que-esnoba-futebol-7742459


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Comentários:
7
  • luiz ibirité disse:

    o chico, c acha que vão procurar um modo de não ganhar dinheiro??

  • thales rosa disse:

    Johny essa reportagem que voce posto mostra o porque estamos enfrentando enxentes, chuvas e mudanças cada vez mais fortes em nosso clima. Um local de esporte e lazer sem arvores com concreto por todos os lados, claro que em dias de forte calor os jogos as 16:00 vao ser um inferno…

  • thales rosa disse:

    O problema aqui é que fizeram alguns estadios onde nem futebol tem!! Manaus, Cuiaba e Brasila por exemplo!!! Brasilia podemos dar um desconto porque se o flamengo fizer 5 jogos por ano vai lotar o estadio com os nordestinos flamenguistas que vivem em Brasilia.

    Mas manaus e Cuiaba alem de nao ter futebol nao tem demanda por evento algum…. Cuiaba é conhecido apenas por ser a entrada para o pantanal norte e Manaus por ser a cidade cercada pela selva… de resto os dois estadios serão elefantes brancos e se for o caso é melhor ate demolir depois que acabar a copa que o prejuizo sera menor.

  • Só faço um pequeno adendo. O Brasil é um país majoritariamente, e infelizmente, do futebol. Como o próprio artigo cita, a França possui outros esportes populares de estádio, como o Rugby.

    Talvez o dia que o Brasil for um país multi-esportivo, os estádio possam deixar de ser “de futebol” e passar a ser “arena multi-uso”. Com atletismo, rugby etc…

    Além disso, como país avançado culturalmente, lá há grande demanda por concertos, óperas e outros eventos musicais. Aqui no Brasil, não é qualquer show que lotaria o Mineirão, por exemplo. Quanto muito, São Paulo e Rio tem estádios lotados em alguns eventos.

    Concertos e óperas então…

    A bem da verdade, é que para o nível cultural e de interesse esportivo do brasileiro em geral, uma ação como essa no Stade de France seria praticamente impossível.

    Mas é claro, isso não é desculpa. Estou apenas mostrando que o caminho aqui tem que ser diferente. É óbvio que é necessário achar uma alternativa para evitar os elefantes brancos.

  • Lincoln Pinheiro Costa disse:

    Chico,

    E aqui os “deputados-boleiros”, aqueles que fazem campanha preferencialmente entre torcedores e são eleitos com o voto desse eleitorado, se recusam a assinar a CPI do Mineirão. Estão recebendo alguma vantagem do Consórcio Minas Arena? Pior, não dão a mínima para as cobranças nas redes sociais. Devem pensar que seus eleitores não estão incluídos digitalmente e não terão prejuízo eleitoral em 2014.
    twitter.com/lincolnpinheiro

  • Ricardo Lemos disse:

    Interessante a leitura recomendada pelo Johnny. Tenho visto Belo Horizonte cada vez mais cinza. E parece que isto não vai ter fim. Qualquer projeto arquitetônico inclui tirar dezenas de árvores de um terreno, cimentar o chão e plantar umas duas mudinhas para “fazer de conta”.

    Sobre a questão da administração do estádio acho que este modelo seria inviável em BH. E não seria nem só por uma questão cultural.

    Estes eventos contam com a participação de turistas (vejam que foram citados 100 mil por ano na França). O maior problema aqui é hospedar e levar estes turistas aos estádios.

    Duvido que alguém que participasse de um grande evento deste recomendasse ou voltasse a BH para um outro, depois de custar para conseguir um hotel para se hospedar e de gastar mais de uma hora se deslocando até o estádio.