É só um clube fora da trilha Rio/SP quebrar a hegemonia de títulos deles na era dos pontos corridos que a imprensa de lá começa a questionar se esta é a fórmula ideal para o campeonato e se, absurdo dos absurdos, houve “justiça” na conquista.
O fato é que, poucas vezes na história do futebol brasileiro uma conquista foi tão justa e incontestável como essa do Cruzeiro.
Mas o futebol é cenário para todo mundo falar o que quer e às vezes é menos ruim ouvir e ler determinados disparates do que ser surdo e cego.
Vejam por exemplo esta coluna da página dois da Folha de S.Paulo, de terça-feira passada, antes da oficialização do título da Raposa.
Interessante é que é um espaço de comentários políticos, além dos editoriais do jornal.
Pela primeira vez este cidadão escreveu sobre futebol.
Confira:
* “Hélio Schwartsman”
Justiça no futebol
SÃO PAULO – A virtual vitória antecipada do Cruzeiro no Brasileirão traz à baila uma discussão recorrente: o campeonato por pontos corridos é melhor que o velho mata-mata? Parece haver certo consenso de que, embora a antiga fórmula nos reserve mais emoções, os pontos corridos são mais justos. Será?
Minha impressão, amparada num pouquinho de matemática, é que seria impraticável desenhar uma competição capaz de medir com exatidão qual o melhor time e, assim, assegurar a justeza do campeonato. Na verdade, a dificuldade se coloca não apenas para o futebol mas também para a esmagadora maioria das modalidades esportivas. O problema de fundo é que essas disputas encerram uma dose muito alta de aleatoriedade.
Imaginemos dois times e suponhamos que um deles seja ligeiramente melhor do que o outro, derrotando-o em 55% das disputas, descontados os empates. A questão é que, mesmo com essa superioridade, o mais fraco vence o mais forte em 9 de 20 partidas que não terminam com igual número de gols. Para eu poder afirmar qual é o melhor com segurança estatística (margem de erro de cinco pontos e intervalo de confiança de 95%), seria necessário que eles se enfrentassem nada menos do que 269 vezes (a conta é de Leonard Mlodinow e me foi confirmada pelo Datafolha).
Se os atletas já reclamam do calendário do jeito que está, o que não diriam de uma final de 269 jogos?
É certo que evitar semifinais e finais de um ou dois jogos já reduz o espaço do acaso, mas não há como ignorar que mesmo as 38 rodadas do Brasileirão, nas quais os times se enfrentam apenas duas vezes, são uma amostra pequena demais para dizer quem é o melhor. O objetivo de “fazer justiça”, receio, é algo inatingível.
O lado bom dessa história é que nós, os torcedores dos 19 times que não foram campeões, podemos dizer de boca cheia que o fato de o Cruzeiro ter vencido, a rigor, não significa nada.
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Fazer o quê, né!?