Senhores, desde ontem estou aqui em Salvador para o lançamento do novo caminhão Iveco Tector, mas já me preparando para retornar a Belo Horizonte.

Apesar da correria, estou muito satisfeito porque acabo de ser informado pelo amigo italiano Michelangelo Deodato, que foi lançado o livro do Paolo Rossi (aquele mesmo do Sarriá, 1982), em Turim, e que está sendo um sucesso de crítica e vendas.
Através de intermediação do Michelangelo, com o próprio Rossi e a autora da obra, a esposa dele, Federica Cappelletti, tive a honra de ser convidado para escrever a repercussão daqueles gols que ele fez e que eliminaram o Brasil da Copa da Espanha de 1982.
Entrevistei pessoas diretamente envolvidas naquele jogo e inseri opiniões pessoais e o que escrevi foi incluído na íntegra no livro, intitulado “1982 Il Mio Mitico Mondiale”.
Um prazer contar um pedaço importante da história do futebol mundial.
Vejam o meu trecho na obra do Rossi:

“Paolo Rossi: o artilheiro que o Brasil nunca esquecerá”
– Por Chico Maia
Lá se vão 30 anos que Paolo Rossi liquidou com o Brasil na Copa da Espanha e o trauma continua no país pentacampeão mundial de futebol. Certamente que nem o próprio Rossi e demais companheiros daquela seleção comandada por Enzo Bearzot, imaginam a profundidade das consequências daqueles 3 x 2 no Estádio Sarriá, de Barcelona, naquela tarde do dia 5 de julho.
No dia 18 de janeiro deste ano comemorativo dos 30 anos, a coluna “Planeta que Rola”, do “O Globo”, um dos mais importantes jornais do Brasil destacava: “Desde a nossa derrota na Copa de 82 e, principalmente, após a conquista do tetra, em 94, o torcedor brasileiro foi levado a crer que futebol bonito é sinônimo de fracasso, e que a força vale mais que o talento. Um engano que durou 30 anos, até surgir o Barcelona de Messi, que há três temporadas vem mostrando que vencer praticando o mais fino futebol-arte é possível. E está longe de ser fruto do acaso. O time de Pep Guardiola apenas segue uma cartilha básica: valorização das categorias de base, aposta em jogadores técnicos em vez de brutamontes que só sabem destruir, disciplina tática, posse de bola e vocação ofensiva. E assim realiza o sonho de qualquer um que gosta de futebol: ver um time que ganha e encanta ao mesmo tempo. Será que do alto da sua majestade de pentacampeão mundial o Brasil saberá aprender com o clube espanhol?”.
Referia-se à aula de futebol dada pelo Barcelona sobre o Santos na final do Mundial Interclubes, em Yokohama/Japão, no mês de dezembro de 2011.
A dor de Luizinho
É quase uma unanimidade na imprensa e torcedores brasileiros e grande parte do mundo, que aquela seleção, dirigida por Telê Santana, foi a melhor montada no Brasil, depois da conquista do tricampeonato no México, em 1970, juntando-se com a equipe campeã na Suécia, em 1958, como as três melhores seleções da história do futebol do país.
E Paolo Rossi é o símbolo maior do que até hoje é chamada como a “Tragédia do Sarriá”, com os três gols que eliminaram a seleção de Telê, mandando os “canarinhos” de volta para casa.
Um dos responsáveis pela marcação de Paolo Rossi, era Luizinho, então jogador do Clube Atlético Mineiro, de Belo Horizonte. Hoje ele é Secretário de Esportes da cidade de Nova Lima e ainda lamenta o que ele chama de “fatalidade”, aquele encontro com a seleção italiana, com Rossi tão inspirado: “Ele estava iluminado naquele dia e quem joga ou já jogou futebol sabe que tem dia que não dá; que nada dá certo, e naquela tarde não ganharíamos de jeito nenhum. O Zico disse depois que se nós fizéssemos 10 gols o Paolo Rossi faria 11!”.
Hoje com 53 anos de idade, Luizinho afirma que foi um privilegio fazer parte daquele grupo e disputar a Copa da Espanha, mas que a dor foi muito grande na época e que aquela derrota representou um atraso na forma do futebol brasileiro jogar: “Se tivéssemos ganhado, o futebol brasileiro não teria abandonado a opção pelo ataque, pelo toque de bola, enfim, o futebol-arte, que felizmente foi resgatado agora pelo Barcelona, e reconhecido pelo seu técnico Pep Guardiola”.
Luizinho se refere à entrevista do treinador catalão, que após a goleada sobre o Santos, no Japão, declarou que o time dele pratica o futebol que os seus pais e avós diziam que antes era praticado pelos brasileiros.
Telê Santana
Telê Santana era um defensor ardoroso do futebol arte e do fair-play. Não gostava que seus jogadores cometessem faltas, não admitia pontapés e até aplaudia o adversário quando este o vencia, por méritos.
Foi o maior alvo das críticas da imprensa por causa daquela derrota; acusado de optar por um esquema muito ofensivo contra a Itália naquela partida, quando o empate bastaria para classificar o Brasil à fase seguinte.
Infelizmente Telê morreu no dia 21 de abril de 2006, em consequência de um Acidente Vascular Cerebral – AVC, do qual foi vítima 10 anos antes.
Mas o seu filho Renê estava presente nos hotéis e vestiários da seleção brasileira em 1982. Hoje com 56 anos de idade, ele também treinador de futebol, e reverencia Paolo Rossi. Acredita que ninguém jamais conseguirá explicar de forma convincente a mudança de comportamento e o crescimento da Itália, justamente contra o Brasil que tinha o futebol mais elogiado até então naquele Mundial, por todo o mundo: “Paolo Rossi foi fenomenal a partir daquele jogo. Era com o se estivesse dopado; não um doping químico, mas uma motivação particular de quem não vinha fazendo uma boa Copa e viu naquele jogo o momento único para se afirmar perante o seu país e ao mundo”, lembra.
Recorda também que o seu pai fora alertado pelo Zezé Moreira, experiente treinador brasileiro na Copa do Mundo de 1954, na Suiça, que a pedido do Telê, observou a Itália nos jogos anteriores para passar as informações para ele: “O Zezé recomendou cuidados com o Paolo Rossi, com a ressalva que ele não vinha jogando bem, mas que era um goleador nato, que se posicionava muito bem em campo”.
E mesmo com os alertas foi impossível parar Rossi, que destruiu a defesa e a reputação da seleção brasileira como favorita absoluta ao título de 1982.
Renê Santana lembra que Rossi impressionou pela movimentação em campo, com muita garra, oportunismo e roubadas de bola para buscar incessantemente o gol do Waldir Peres.
Renê conta também que logo após o fim da partida o sentimento era de revolta pela eliminação, porém, com o passar das horas o reconhecimento ao mérito de todo o time italiano foi unânime, com destaque para Paolo Rossi: “Naquele dia ocorreu uma coisa inédita, quando o meu pai chegava para a sala da entrevista coletiva, onde já se encontrava o técnico Enzo Bearzot, que foi muito gentil e se levantou para cumprimentá-lo. Neste momento, toda a imprensa presente, também se levantou e aplaudiu o meu pai, de pé, numa atitude rara no Brasil, de reconhecimento público a quem perde uma disputa”.
Ele se recorda também que o ônibus da delegação foi aplaudido pelas ruas de Barcelona, do Estádio Sarriá até o hotel onde a seleção estava hospedada: “Chegamos ao hotel e aí foram cenas inesquecíveis de emoção e lamentos. Alguns jogadores choravam, outros bebiam e se abraçavam, também chorando, lamentando, mas reconhecendo que aquele 5 de julho foi, por méritos, da Itália”.
Nessa entrevista que nos concedeu em Belo Horizonte, onde vive com a esposa Rafaela, Renê fez uma revelação interessante: por sugestão de Johan Cruyff, o Barcelona enviou um diretor ao Brasil para tentar contratar Telê Santana para substitui-lo, porque admirava a forma de os times dele jogar: “Eles chegaram a iniciar as negociações, mas logo em seguida o meu pai teve o AVC, e ficou impedido de trabalhar”.
Telê comandou o Brasil também na Copa de 1986, no México, sendo eliminado nos pênaltis pela França, de Michel Platini.
Ele voltou a encantar o mundo com o time do São Paulo, bi-campeão da Copa Libertadores da América e Mundial Interclubes, nas disputas contra o Barcelona em 1992 e Milan em 1993.
Eder
Outro importante jogador em campo naquele 5 de julho de 1982 foi o ponta-esquerda Eder, que na época também defendia o Atlético Mineiro.
Dono de fortíssimo chute, um dos melhores cobradores de penalidades da história do futebol brasileiro, ele sustenta que, com aqueles três gols contra o Brasil, Paolo Rossi influenciou não só os treinadores brasileiros, mas do mundo, na forma de escalar taticamente os seus times. “Jogávamos como joga hoje o Barcelona, sem guardar posições fixas, confundindo os adversários com movimentação intensa em campo. Eu teoricamente era ponta, mas jogava pelo meio, às vezes atuava como ala, e o Junior ia para o meu lugar; o Zico corria por todo o campo; o Cerezzo saia do meio e costumava cruzar para o Falcão ou outro companheiro marcar; era um time fantástico!”.
Eder lamenta que por causa daquela derrota para a Itália os treinadores passaram a pensar mais em jogar defensivamente, com a ordem de primeiro não sofrer gols, para depois, tentar marcá-los.
Eder lembra uma característica perversa da imprensa e dos torcedores no Brasil: “Aqui só interessa o primeiro lugar, pois ficar em segundo ou em último tem o mesmo valor”.
Hoje empresário e comentarista esportivo da Rede Bandeirantes, Eder ressalta que aquela seleção deixou tão boas lembranças que até hoje por onde ele vai, em qualquer parte do mundo, as pessoas falam bem e lamentam aquela derrota de 3 x 2 no Sarriá.
“Era o dia de Paolo Rossi e da Itália, cujo time jogou tanto quanto nós, mas que soube aproveitar melhor as oportunidades que teve, porque o Rossi se posicionava muito bem em campo e era um oportunista raro”, completa.
Como o Mundial de 2014 será no Brasil, a imprensa está com farto material sobre a história das Copas, com destaque especial para os 30 anos da Espanha’82.
E Paolo Rossi é nome tão conhecido no país quanto aos grandes craques que entraram para a história do futebol brasileiro.
Naquele Mundial a FIFA elegeu pela primeira vez o “Craque da Copa” e quem venceu foi justamente o nosso “carrasco” na “Tragédia do Sairrá”. No dia 31 de janeiro deste ano, o jornal O Globo dedicou a ele uma página inteira com a manchete: “Paolo Rossi, o rei de 1982 – O Bambino D’Oro que ofuscou o futebol-arte de Telê Santana, Sócrates, Zico & Cia”.

Paolo Rossi no dia do casamento com Federica.