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Felipão não quer morrer

Há figuras que a gente tem que parar para ler, ver ou ouvir, porque sempre tem coisas interessantes para falar.

No futebol, Felipão é um bom exemplo, como nessa descontraída entrevista à Mônica Bergamo, na Folha, segunda feira.

Numa das respostas ele lembra que jogador de futebol adora uma desculpa para explicar resultados ruins, transferindo responsabilidade. Neste caso ele fala de arbitragens, mas gramado é outra desculpa esfarrapada na maioria dos casos.

Vale a pena ler:FELIPAO

Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

Felipão não quer morrer

O técnico do Palmeiras, que não tem medo de assalto nem de avião, diz que tem sido tão feliz e que é tão boa a vida que, aos 61, o coração aperta com os “poucos anos” que imagina ter para viver

Luiz Felipe Scolari, o Felipão, acordou cedo na sexta. Um dia depois do empate entre Palmeiras e Botafogo, ele disse que só conseguiu dormir às 3h. Antes de sair pela cidade para procurar apartamento para morar, o técnico do Verdão, que 47% dos torcedores queriam ver na seleção (contra 8% de Mano Menezes), segundo o Datafolha, recebeu a coluna para um bate-papo no café da manhã:

 

Folha – Vai morar sozinho?
Luiz Felipe Scolari –
Eu voltaria ao Brasil no fim do ano. Surgiu o convite do Palmeiras e eu falei: bem, o que nós vamos fazer? Em Portugal, o meu filho, Fabrício, entraria direto na faculdade. No Brasil, ele teria que fazer o vestibular. Então eles vão ficar lá por mais um tempo. Nós [ele e a mulher, Olga] sempre planejamos tudo juntos. Quando fui ser técnico na Arábia Saudita [em 1984], ela optou por cuidar de filho, de casa, deixando algo de que gostava muito, que era lecionar. Eu tenho amor e gratidão por isso. Porque acompanhar técnico de futebol é um saco!

Por quê?
Tu tá aqui e amanhã já tá com a mala pronta pra sair de novo. Tu vive a angústia do dia a dia, de um bom resultado [nos jogos]. É difícil. A maioria dos técnicos, pode ver, vão se separando no caminho. Os jogadores também. Porque é um ambiente propício a muitas coisas.

Tipo o quê?
Tipo muitas coisas. Muitas facilidades, em tudo.

Mulheres?
Em tudo, em tudo.

O assédio feminino é grande?
É grande. E se tu não tens um perfil, uma personalidade, um respeito, tu põe o teu casamento fora.

E a solidão aqui em SP?
Pois é. Pra mim é muito triste. É horrível. E eu não gosto de ficar em hotel. Eu gosto de fazer o meu sanduíche, a minha salada. Eu gosto de ficar em casa, de ver TV. Quando terminar aqui [a entrevista], eu vou procurar um apartamento. No décimo andar. Para subir lá, é difícil.

Se preocupa com segurança?
Não, nada. Eu fui agora à África do Sul e fomos a Soweto. O pessoal de lá falou: “Ah, não, sozinho não”. Eu falei: “Olha, eu ando em tudo o que é lugar. Não quero segurança, não quero ninguém. Eu me viro, pode deixar”. Eu ando aqui em SP sozinho, pego o carro, dirijo. De cem pessoas que eu conheço, 99 eu trato bem e eles me tratam bem. Que medo eu posso ter? Eu nunca fui assaltado. São duas coisas na vida de que não tenho medo: de andar na rua e de avião.

E do que o senhor tem medo?
Ah, eu tenho… medo, não. Eu tenho um sentimento. Eu tenho 61 anos. Já tá ali… Tu vai me dizer: “Vai viver até os 80”. Ok. Mas são tão poucos anos. E é tão boa a vida! Podia durar mais uns 35 que valeria a pena.

Tem medo de morrer?
Medo, não. É que eu não queria [morrer]! Mas sei que vou, né? Só que é tudo tão bom, eu vivi tão bem esses anos, tão feliz, desde minha infância até agora, que eu não noto que já tenho 61. E às vezes eu ouço: “Fulano morreu”. Morreu? “Tava com 75 anos.” Aí dá um [põe a mão no coração e suspira] opa! Pra mim só faltam 14!

Tem medo do esquecimento?
Não, não. Eu estou planejando encerrar a carreira em 2014. Encerrada a Copa no Brasil, vou fazer alguma coisa dentro da minha área, mas não como técnico.

O senhor sonha em comandar a seleção em 2014?
Quem passou lá dentro fica muito marcado. Mas eu não tenho o sonho só com a a seleção brasileira. Eu gostaria de encerrar a minha carreira esportiva dirigindo qualquer seleção. Quem sabe até da América do Sul.

Ricardo Teixeira, presidente da CBF, teria ficado chateado porque você deixou claro que não queria a seleção agora.
Eu tô empregado, no Palmeiras. Tu é da Folha. Outro jornal vem e diz: “Eu quero a Mônica”. Aí tu diz: “Ah, eu quero!”. Isso não existe. Primeiro, eu não fui convidado. Depois, eu tinha que ter pelo menos a hombridade de respeitar meu contrato com o Palmeiras.

A CBF precisa de renovação? O tempo de Teixeira passou?
Essa história de que o novo é melhor nem sempre é verdade. Com o Ricardo Teixeira na CBF, o Brasil já teve dois campeonatos [em 1994 e 2002] e um vice [1998]. Sendo que não ganhava [uma Copa] desde 1970. Então, pode renovar. Mas para isso eu tenho que confiar no novo.

O futebol brasileiro ainda é o melhor do mundo?
É.

Mas estamos há duas Copas sem passar das quartas.
Eu pergunto: quem exporta mais jogadores? Brasil e Argentina. Eu digo pra ti: ainda é o melhor do mundo. Agora é que a Espanha tá jogando um futebol parecido com o sul-americano. Curto, passe, pé em pé.

Falta comprometimento?
O Dunga pode ter tido um ou outro erro, mas trouxe novamente ao Brasil essa ideia de os jogadores estarem comprometidos com a seleção.

Mas precisava deixar os jogadores 40 dias sem folgas?
Pois é. Na Copa de 2002 [quando era técnico da seleção brasileira], antes de sairmos do Brasil, passamos toda a programação para os jogadores. Quais eram os dias dos jogos, quando teriam folgas. Eles passavam para as famílias, para quem bem entendessem.

Houve exagero?
[Concordando] Ah! E jogador, quando fica totalmente fechado, dá jeito de burlar.

A Globo manda na seleção?
É tudo história. Em 2002, pelo menos, eles foram muito corretos. Desde o começo, eu disse que não privilegiava nem A nem B. Quando precisavam de alguma coisa, nos solicitavam. Quando precisávamos, eles nos ajudavam. Esses [jornalistas] que são atendidos de uma forma diferente também têm que dar retorno. Essa história de Cristo, olha, eu dou os dois lados para bater… não mesmo!

O senhor teme o fantasma da Copa de 1950 em 2014?
Todo mundo teme. Outro dia, num evento no Recife, o [ex-zagueiro] Ricardo Rocha falou: “Ô, professor, olha que em 2014, quem pegar, pelo amor de Deus, porque aquele fantasma…”. Já passou, encerrou. Agora é 2014. Temos condições, bom time. Vai ter uma meninada boa.

Quem é hoje o nosso craque?
Continuo dizendo que o Robinho é muito bom, o Kaká é espetacular. Tem o Lúcio. Nos próximos dois, três anos é que a seleção vai ser realmente montada. E vão surgir os novos craques.

Convocaria Ganso, Neymar e Pato para a Copa da África?
Não. Não era o técnico.

E para um time?
Ô, pra qualquer time. Ninguém fala. Mas tem um volante do Internacional que foi para o Tottenham, o Sandro, que é muito bom. No Ceará tem o Mizael, um ponta pelo lado do campo, o que hoje é raro.

Vamos ter um outro Pelé?
Olha, não tem ninguém perto dele.

Pelé ou Maradona?
Ah, pelo amor de Deus! Pelé é dez. Maradona é oito.

E Maradona como técnico?
Eu achei interessante (rindo). Eu gostava de ver o jeito dele, o envolvimento, a forma como agia no campo. Era diferente dos outros técnicos, mais metódicos, quietos. Até torci, achei que a Argentina chegaria mais à frente.

O senhor já disse que prefere ganhar do que jogar bonito.
Jogar bonito é pra amistoso, jogo beneficente. Se puder ganhar e jogar bonito, ótimo. Ontem [na quinta], jogamos um jogo até razoável. E foi 2 a 2 [entre Palmeiras e Botafogo]. De que adiantou?

O senhor reclamou do juiz.
Os jogadores reclamam muito no vestiário de que nós somos prejudicados.

Eles acham que, como o Luiz Gonzaga Belluzzo, presidente do Palmeiras, votou contra Teixeira no Clube dos 13, a arbitragem retalia o clube?
É o que eu ouço falar. Vou acabar com esse assunto logo, logo. Se eles passam a acreditar nisso, não têm o empenho necessário para superar as dificuldades.

Tem muito juiz ladrão?
Ah, não tem, não. O que acontece são erros absurdos dos árbitros. Mas não é só contra o Palmeiras.

O time ganha o Brasileirão?
É difícil. O nosso grupo é muito pequeno. Os outros estão com um número de jogadores maior, bem escolhidos. Nós ainda temos que formar. Vamos ter que direcionar para a [Copa] Sul-Americana.

Jogo rápido: sua maior felicidade.
A minha família.

Sua maior tristeza.
Meu pai [Benjamin] ter morrido quando eu começava a carreira de técnico. Ele ia ver o filho dele conseguir uma identidade nacional.

Sexo ou sorvete?
Sexo. Pelo amor de Deus! Sorvete toda hora tu tem ali. Sexo, de vez em quando.

Felipão em uma frase.
Eu sou um bom amigo.


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Comentários:
4
  • ANTONIO MARCOS CRISTAIS-MG disse:

    Gostaria de ter o Felipe como amigo!

  • Dudu GALOMAIO disse:

    Felipão é um vitorioso.
    Só acho que na pergunta “sexo ou sorvete?” ele blefou… rsrsrs
    Com 61 anos? Bom, talvez ele deveria ter respondido: “Sorvete toda hora tu tem ali. Sexo, MUITO RARAMENTE.” hahaha

  • Paulo Koller disse:

    Chico. Bela Entrevista da Monica Bergamo. Esse cara é muito foda. Queria tê-lo no Galo. Ele tem a nossa cara.

  • Emílio Melo Figueiredo disse:

    Bela entrevista!

    E se fosse o Dunga?!

    Por isso que a maioria dos brasileiros nem se importou com a eliminação do Brasil.

    Ta aí a entrevista de um cara que além de vitorioso, humilde, é atencioso com todos.

    Critica: Nao ganhou nada com o Cruzeiro! Infelizmente!