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Morreu de tanto viver!

O texto é do Flávio Gomes, jornalista de São Paulo; uma belíssima homenagem ao Sócrates.

No fim, essa frase do Flávio, muito legal, que o ex-craque “morreu de tanto viver”.

Quem nos enviou foi o Marco Antônio Falcone, mestre cervejeiro, dono da Falke Bier, a melhor cerveja brasileira.

Este que aparece na foto com o Sócrates, em encontro de cervejas especiais em Ribeirão Preto:

Doutor Socrates

* “PORRA, DOUTOR”

SÃO PAULO – Aí quando eu estava lá embaixo no meio daquele milhão de pessoas pedindo para votar para presidente, o cara sobe lá no palanque, em cima do viaduto, ergue o punho direito, ou o esquerdo, e grita que queria a mesma coisa. Do meu lado, gente de todas as cores e credos ludopédicos erguem seus punhos, também, e aplaudem o cara, que resolveu não jogar na Europa porque queria estar aqui para ver de perto o fim daqueles anos em preto e branco.

Não deu nada certo, não votamos para porra nenhuma, e dias depois, ou semanas, não me peçam para lembrar os quandos e ondes, mas acho que era no Morumbi, e o cara enfia a bica da intermediária, nosso goleiro sem pescoço pula e não pega nada, ele ergue o punho de novo e eu xingo o cara com todas as minhas forças, doutor do caralho, filho da puta, vai tomar no cu.

Antes, Copa do Mundo na Espanha, Brasil versus União Soviética. Estamos lá na zona leste, num puxadinho junto com um monte de gente que eu também não conhecia direito, uma TV com bombril na antena, umas brahmas, gol dele, o empate, se bem me lembro. Abraços e beijos, doutor do caralho, filho da puta, joga demais, vamos, porra.

Depois daquela Copa acho que não torci mais para seleção nenhuma, depois daquela ninguém mais nos representou, talvez em 1986, era um restinho daquela, o cara estava lá de novo, com faixa na cabeça, quatro anos mais velho, mais cabeludo e mais desgostoso, perdeu um pênalti, nem xinguei de doutor do caralho. Já tinha feito muito, tudo bem, entre uma e outra ele tinha ido e voltado da Itália, aí foi jogar no Rio, queria ficar junto do povo, do povo inteiro, jeitão de fim de carreira, mas era médico, ia parar e vestir o jaleco para cuidar do povo, e ele dizia povo com autoridade, sabia bem quem era o povo, e cada um para o seu canto. Eu, que o conhecia da TV, do estádio e do Anhangabaú, para cuidar da minha vidinha besta; ele, para cuidar do povo — no falar, escrever, pensar.

Avança a fita.

Ano passado, um velho e empoeirado e querido pub em Pinheiros, faz frio, as portas já fechadas, o dono não quer nem saber, quem quiser fumar, fume, fumem e bebam  antes que o mundo acabe, o amigo tocando violão, a gente ali, tentando entender o que estava acontecendo com nossas vidas, aí ele entra alto, forte, senta, pede um vinho, sorri, canta, sorri, bebe, sorri, fuma, e a gente tira foto com ele, e o mundo é um lugar até aceitável quando a gente vê que tem gente como ele, que jogava bola, que só vencia a timidez diante da multidão falando e tocando de calcanhar, e que sorria, e bebia e fumava.

Sócrates morreu de tanto viver, que é uma boa forma de morrer.

* http://flaviogomes.warmup.com.br/2011/12/porra-doutor/

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Comentários:
5
  • sergio disse:

    Me recordo dessa frase “Morreu de tanto viver” no livro do Ian Fleming ”Moscou contra 007”. Penso que apesar de tudo, o Socrates é daquela última geração legal do futebol brasileiro, onde os caras jogavam mais e eram outro tipo de pessoa. Me recordo de um golaço que o cara fez num amistoso da Seleção Brasileira contra o Ajax da Holanda. E não era só ele. Havia o grande mestre Telê, que perdia partidas mas mandava o time ir para cima jogar bonito, havia o grande Falcão que era cabeça de área mas ia lá na frente e fazia gol. Fora Reinaldo que marcava golaços em Maracanã lotado, jogando contra tudo e contra todos e saia com o punho levantado,numa postura política lembrando o gesto dos Panteras Negras. E também havia o Clube da Esquina. Aquela época era muito boa. Um abraço.

  • Alisson Sol disse:

    Como disse o excelente e raro obituário do NY Times para um esportista estrangeiro, Sócrates deu várias declarações polêmicas em vida, incluindo a de que “Eu bebo, fumo e penso“. E além disto jogava bola bem, o que é mais do que a maioria dos “craques” atuais pode almejar…

  • tom vital disse:

    Carpe diem,quam minimum credula postero.
    Colha o dia,confie o mínimo no amanhã.

    ( Horácio,Poeta Latino)

  • Steferson Leite disse:

    Chico, boa noite.

    Em 1º lugar, gostaria de parabenizá-lo pela competÊncia e dedicação com que desenvolve seu trabalho, o qual acompanho desde 1997 com Flavio Carvalho na Band.

    Gostaria de manifestar minha insatisfação quanto ao jogo de ontem, no qual ficou explícito que houve um combinado, não se sabe (ainda) com quem, mas ficou muito claro.

    A imprensa mineira e o Sr. presidente do Atlético vem tentando defender os clubes, porém é claro e fato que sempre houve e provavelmente sempre haverá combinação de resultados, seja por motivos pessoais, políticos, econômicos ou quaisquer outros.

    O fato, é que um time que vinha brigando com os melhores do campeonato e vencendo a maioria deles, simplesmente “não entrou em campo” na ocasião. Por mais que o Cruzeiro tenha jogado bem desde o início, me recuso a acreditar que a turma de preto e branco desaprendeu a PROFISSÃO em uma semana e por causa de um “churrasco” durante a semana de clássico. No mínimo três lances claros de má vontade dos marcadores (e titulares), dão embasamento para que não se acredite em um jogo “normal”. Se assim o for, o que dizer de amadores que tem seus empregos/profissões durante a semana, churrasco e cervejada no sábado e jogos pelas ligas regionais aos domingos?

    E mais: O Sr. Piadinhas (presidente do outro clube) não se manifestou. Isso é normal(?).

    Desculpem-me mas minha curta inteligência não me permite concordar e nem entender tal situação pela forma que vem sendo plantada. Fica a sensação de que algo foi combinado e quando tentaram “mostrar serviço” não conseguiram se encaixar e daí…

    Se chegarem ou houver outra realidade para essa situação, fica a questão: É mais feio pra quem “doou” ou pra quem “recebeu”?

    Abraço.

    – Betim