Blog do Chico Maia

Acompanhe o Chico

Lição de vida!

Emocionante o relato pessoal do Vittorio Medioli, um dos empresários mais bem sucedidos do país, sobre o seu drama pessoal no enfrentamento de um grave problema de saúde.

Foi na sua coluna de volta ao jornal O Tempo, domingo, dia 4.

Uma lição de vida, que vale a pena ler.

* “Vittorio Medioli”

Estou de volta

Ausente desta coluna desde agosto do ano passado, quando informei uma licença de três meses, bem atrasado, estou de volta. Devo, assim, explicação aos leitores que reclamaram minha primeira deserção desde a estreia como colunista, em 1997. Olhando pela popa vejo mais de mil crônicas e opiniões escritas no meu computador de casa, no notebook em salas de esperas, em voo para algum lugar, no sufoco, algumas vezes reescritas na vigésima quinta hora para atualizá-la ao precipitar dos acontecimentos.

Afastei-me, em setembro, por razões incontornáveis de saúde. Na época sentava ao computador e meu raciocínio afetado pela encefalopatia, provocada por excesso de amônia no sangue, era responsável por uma névoa espessa e muita confusão. Enfrentava uma fase adiantada de cirrose hepática em decorrência de uma hepatite contraída no começo da década de 90.

De lá até 2011, foram inúmeros tratamentos e peregrinações a consultórios e hospitais para tentar adiar a degeneração progressiva do fígado e manter-me ativo. Entretanto, a partir de 2005, hemorragias e febres constantes deram o sinal de que a única forma de contornar a falência de meu órgão era um transplante.

A palavra me horrorizava. “Prefiro morrer”, disse várias vezes aos médicos e a familiares que me incentivavam a dar esse passo. Pensar que dependeria de um órgão de outra pessoa falecida, inserido no meu corpo, me abalava profundamente. Foram centenas de pesadelos e noites insones remoendo o “transplante”.

Pesava também a crença filosófica/religiosa: “A cada um é dado um tempo para realizar a sua obra…” e se o meu estava hepatologicamente esgotado, já com um grande volume de realizações que eu deixava de legado, não teria por que fugir do último ato.

Pensava em me entregar e repetia: “Deus seja feita a tua vontade, não a minha”. Acreditei que aceitar o desígnio do meu Deus era a melhor coisa, então a minha vida continuaria em outras esferas, sem esse corpo perecível e esgotado.

Entre os distúrbios físicos e as dores, a depressão e as lágrimas, a perda de autonomia e a dependência de fármacos, minhas convicções mudaram de repente.

A família e as filhas herdariam um monte de transtornos materiais dos quais me culpariam. Mudou a forma de sentir o drama apenas como pessoal e intransferível.

Deixar-se morrer era uma atitude egoísta? Se a medicina e os recursos atuais me ofereciam uma possibilidade de iniciar uma “segunda” vida, ainda fazendo proveito de toda a experiência da primeira, deveria aproveitar?

Os distúrbios se faziam insuportáveis, uma ascite persistente (acúmulo de líquidos pelo corpo todo, chegava até 23 litros), com as noites em branco, com a perda de qualquer apetite e mobilidade, só me restava meditar pesarosamente deitado na sombra do meu quarto, sem energia até para ler, e assistir a programas de TV.

Recorria-me o mantra: “Como será esse pequeno mundo em minha volta sem mim?” Bobo! Respondia: “as covas estão cheia de insubstituíveis”. Sempre existirá quem leve à frente o destino, para o bem ou para o buraco. Paradoxalmente, os dois aspectos, para o equilíbrio do Universo, se equivalem, pois a obra se preserva eterna em sua essência e a matéria precisa se decompor para dar vida às novas formas, melhores e mais resistentes.

Quem desempatou o dilema foram as filhas e a esposa. Passei a ver o transplante como um gesto de respeito a elas. Enfim, se desse certo ou errado, teria cumprido com um compromisso de amor a elas e, também, de respeito a uma infinidade de colaboradores e funcionários que dependem da integridade das empresas que dirijo. Apesar de eu ser apenas um nome para milhares desses dependentes, que não conheço pessoalmente, o nome “Vittorio” acrescenta segurança à empresa. Para suas vidas, mais serenidade para encarar o futuro.

O meu caso de doença era especialmente complicado e doloroso, e, atendendo conselhos de amigos, me mudei para São Paulo à procura de uma cirurgia reparadora no maior centro de transplante do país.

Em maio do ano passado, entrei na lista do Ministério da Saúde, única que conta para todo o Brasil e que distribui os órgãos coletados. Dessa forma, a escolha se dá pela gravidade dos casos, resultante dos exames laboratoriais de cada paciente. A fila anda em função do Meld – critério mundial de maior gravidade.

Na escolha do paciente/receptor o que verdadeiramente pesa são os exames laboratoriais, não recomendações ou outras atitudes.

Provavelmente, é o único caso no Brasil em que não se encontra discriminação entre pobres e ricos. Contudo, se depara com o fato de que a escassez de doadores aumenta cada vez mais os índices do Meld no topo da lista. Não é raro que alguns cheguem a se habilitar em estado deplorável e com escassas condições de sobrevivência para enfrentar uma cirurgia tão complexa.

Passei quatro meses internado, já que, fora do hospital, não conseguiria tomar os cuidados necessários para enfrentar o transplante com razoáveis condições de sobreviver ao impacto.

Fui convocado para a sala cirúrgica, pela primeira vez, numa noite no início de outubro, mas o órgão doado aparentemente aproveitável apresentava graves problemas que impediam seu uso. Para mim foi uma experiência de grande emoção.

Minha vez “verdadeira” chegou em 17 de novembro, quando irrompeu, pela manhã, em meu quarto, o cirurgião (que, depois, ficaria meu amigo) e disse “Meu caro, hoje é o seu dia, às 18h quero você na sala cirúrgica”.

Foi assim que, na noite de 17 e na madrugada de 18 de novembro, ganhei um novo fígado. Foram necessárias, em seguida, duas cirurgias adicionais, até o final de novembro, para completar a obra que estava dando problemas. Na véspera de Natal recebi alta, saí de cadeira de rodas do hospital e festejei, em São Paulo, o melhor Natal de sempre, o primeiro do resto de minha vida.

Estou extremamente feliz e grato a Deus e aos médicos que me assistiram nessa travessia (Ben-Hur, Rogério, Sérgio, Renato, Maria Paula e Márcio, em São Paulo, e João Galizzi e José Olinto, em Belo Horizonte), e aos incontáveis enfermeiros e enfermeiras que passaram por meu quarto nos longos meses de internação tratando-me com incrível atenção e carinho. E não posso deixar de agradecer às minhas filhas e esposa que se revezaram ao lado de minha cama.

* http://www.otempo.com.br/otempo/colunas/?IdColunaEdicao=17975&busca=Estou%20de%20volta&pagina=2


» Comentar

Comentários:
1
  • Romeu Evangelista disse:

    …Olá Chico !!!
    Tanto tempo ,saudações !!
    Feliz e lindo relato do sr vittorio,pessoa a quem desde jovem sempre acompanhei sua posiçao no ramo empresarial,ai Sete Lagoas e em toda Minas ,fiquei emocionado,porque vim pra Marabá PA,com sintomas de problemas epatico,mas graças a Deus não foi preciso intervençao cirurgica.
    mesmo sendo anônimo,feliz recuperaçao e retorno..
    …Deus abençoe !!!