Rebaixado pela terceira vez à Série B, o Botafogo luta para sobreviver. No futebol ou em qualquer empresa, sem aumentar receitas e diminuir despesas não tem jeito. Acreditar apenas na força da marca, da tradição, da paixão, dos “mecenas” e essas coisas é um risco sério, raramente bem calculado. O Botafogo entrou nessa e dançou feio. Por exemplo, acreditou que os irmãos João e Walter Moreira Salles (Unibanco/Itaú, dentre outras coisas), botafoguenses apaixonados, iriam viabilizar o clube, como aventado em 2019. Naquele mesmo fim de ano, o blog FogãoNet, dava sinais de desilusão:
* “Com novos investimentos ou não, irmãos Moreira Salles já deram futuro ao Botafogo
A notícia do Blog do Lauro Jardim (“O Globo”) de que os irmãos Moreira Salles não vão mais investir no Botafogo não chega a ser uma completa novidade. Nem é motivo para preocupação. Desde que o projeto ganhou força, os apaixonados botafoguenses fizeram questão de dissociar sua imagem, disseram que não vão ser donos do clube e que o “compromisso tinha se encerrado” com a contratação de estudo com a Ernst & Young. Algo totalmente normal, dado que os irmãos têm como característica a discrição. Se vão investir novamente no futuro ou não, nos parece precipitado cravar. Ninguém tem bola de cristal ou certeza de como serão os próximos anos do Botafogo. Mas é pouco provável que eles, botafoguenses fervorosos e que sempre ajudaram nas horas ruins, se afastem totalmente.
De qualquer maneira, os investimentos dos Moreira Salles (cerca de R$ 50 milhões) já deram perspectiva de futuro ao Botafogo. Afinal, um Centro de Treinamento para futebol profissional e base dará frutos por muito tempo. E ao iniciarem o projeto da Botafogo S/A, com o estudo, apontaram o caminho do clube como empresa para os próximos anos e abriram a possibilidade da chegada de novos investidores. (https://www.fogaonet.com/blog-da-redacao/com-novos-investimentos-ou-nao-irmaos-moreira-salles-ja-deram-futuro-ao-botafogo/)
Em 28 de outubro de 2020, um dos botafoguenses que mais ajudaram o clube nas últimas décadas, Carlos Augusto Montenegro, deu entrevista bem realista a Emanuelle Ribeiro, do Globoesporte.com:
* “Em meio à turbulência no Botafogo, Montenegro afirma: “O clube está falido””
Clube vive dia movimentado após derrota para o Cuiabá. Dirigente conta: “Outro dia comprei 18 bolas de futebol para eles treinarem. Não tinha bola!”
O Botafogo vive dia turbulento depois de perder para o Cuiabá no jogo de ida das oitavas de final da Copa do Brasil na última terça-feira. Após declaração polêmica de Felipe Neto e demissão do técnico Bruno Lazaroni, o membro do comitê executivo de futebol Carlos Augusto Montenegro convocou a imprensa para uma entrevista coletiva, afirmou que “o clube está falido” e contou ter precisado comprar bolas para os jogadores treinarem.
– Eu já estava com vontade de sair, mas agora eu não posso, pois seria covarde. Poderia desmarcar essa entrevista, mas preferi fazer. Essa será uma entrevista histórica, pois será a última que pretendo fazer. A ideia do comitê preservou algumas pessoas no Botafogo, quem mais aparecemos somos eu e Rotenberg. Coloco a cara e acabo pagando por isso, mas não vou mudar com 66 anos. Está na hora de eu sair, pois está me fazendo mal – afirma Montenegro.
“As pessoas não entendem que o clube está falido, que não tem dinheiro para pagar água e luz, ficam pedindo Luxemburgo, Abel, contratações, mas não sabem que subimos alguns atletas na marra, a própria efetivação do Bruno foi por falta de dinheiro”
“Corre risco de levar W.O. Não tem receita, só conseguimos pagar salários. A vida não é só isso. Temos viagens, concentração, treino, água, luz, gás, bola. Outro dia comprei 18 bolas de futebol para eles treinarem. Não tinha bola! Por isso não estão jogando bem? Não! Porque eu comprei bola. Quem vai ajudar? Uma vaquinha? Felipe Neto? As pessoas que cobrem o Botafogo? Não sei quem vai fazer isso. Por isso precisamos de dinheiro novo”
Sobre a S/A, o dirigente explica que o projeto não acabou. De acordo com o orçamento montado, o clube contava com R$ 126 milhões dos irmãos Moreira Salles, mais R$ 54 milhões captados pelo ex-líder do plano de negócios Laércio Paiva. Sendo assim, faltavam R$ 70 milhões para o plano ser colodado em prática. Montenegro diz que o objetivo não acabou, mas que não existe otimismo. O chamado “Projeto 1” esfriou, mas o “Projeto 2” segue a todo vapor, começando do zero.
– A ideia era conhecer dinheiro novo. Isso começou ano passado com o estudo da Ernst & Young, bancado pelos irmãos, depois surgiu a ideia de montar um plano para arrecadar dinheiro para pagar as dívidas e também investir no time. Junto com o plano surgiu o Laércio Paiva, uma pessoa envolvida já com o clube e ajudou milimetricamente a levantar todos os credores do Botafogo. Aí formaram um grupo que foi pautado por tentar salvar o Botafogo de qualquer maneira, nunca se falou em política.
– Montamos um orçamento, uma proposta para atrair investidores. Viajei no fim do ano passado, fiquei três meses fora, as coisas andaram. Foi contratada uma empresa especializada, que referendou toda a parte da dívida, isso a gente tem na ponta do lápis. Apareceram os irmãos, que queriam pilotar isso, ofereceram metade mais 1 (R$ 126 milhões). Essa empresa não tinha experiência para conseguir o resto. Quem ficou com esse papel acabou sendo o Laércio e ele fez bem, mas enfrentou problemas. Primeiro a pandemia, e segundo que ele encontrou alguns botafoguenses que já ajudaram no passado e não quiseram. O Laércio conseguiu R$ 54 milhões e empacou. O projeto não acabou, mas não estou otimista. Pode ser que amanhã apareçam os R$ 70 milhões – explica Montenegro.
– O próprio Felipe Neto, que eu gosto muito, se comprometeu a botar R$ 3 milhões e depois desistiu. Tentaram falar com ele por um mês e ele não retornou. Não tem problema, o dinheiro é dele e ele põe se quiser. Pode acreditar em um momento e desacreditar em outro. A única coisa que ele fez errado na minha opinião foi incendiar um processo que não tinha nada a ver, foi ele misturar uma derrota pro Cuiabá com S/A. Achei isso covarde. Ele colocou uma informação falsa, como se o comitê tivesse mudado o valor pra investir. Pelo contrário, o comitê diminuiu o custeio, fez uma folha que eu considero ridícula pra ajudar. Eu já fiquei nervoso algumas vezes por causa de Botafogo, e o Felipe Neto ficou nervoso. Ele falou o comitê, e eu me senti atingido.
– O Botafogo está falido, toda receita está penhorada. Felipe Neto está omitindo a verdade dizendo que vai chegar à falência. Está falido. Se não fosse a torcida, se não fosse o comitê, se não fosse a ajuda de algumas pessoas, o clube já estava falido. O que estamos tentando é achar dinheiro novo para tirar o clube da falência.
– Podia estar apenas chateado em casa, mas não, estou botando a cara, botando dinheiro, a torcida me chama de presidente eterno, estou tentando ajudar. Algo me diz que preciso fazer alguma coisa para ajudar o Botafogo a sair da falência. Quando eu tentava devolver a sede do Botafogo o Felipe Neto não tinha nascido. Vamos falar sério, arregaçar a manga, ajudar o clube. Eu atrapalho e ajudo, mas estou tentando.
“Eu perdoo o Felipe Neto, ele me atingiu violentamente pelas costas. Mas foi um desatino de um torcedor. Sem razão. Ele mentiu, falou algo sem pé nem cabeça”
– Estou arrasado de ter jogado mal e perdido para o Cuiabá, mas temos que levantar a cabeça e seguir em frente. O jogo lá será em campo neutro, temos que tomar atitude para devolver com juros na semana que vem. São mais de R$ 3 milhões em jogo para um clube falido. A falta de ânimo, a mesma escalação, isso me incomoda. Ontem não teve nada de diferente, foi patético.
Projeto S/A
– A Globo pagou a multa do Campeonato Carioca, vendemos o Luis Henrique, ofereci apresentar logo a proposta aos credores e diminuir o valor abatendo despesas, mas o grande investidor não aceitou. O projeto acabou? Não!
– Em meio a isso, apareceu o Gustavo Magalhães com as críticas, dizendo que não podíamos recusar investidores. No projeto 1, os investidores majoritários não aceitavam não ser majoritários. O projeto 1 esfriou, e o projeto 2 está a todo vapor. O fato é que o projeto 2 começa do zero, o projeto 1 começou com R$ 126 milhões. O Laércio é um precursor da ideia de buscar dinheiro novo, trabalhou pra caramba, ele sempre vai ser homenageado em qualquer momento que tivermos êxito. Precisamos de dinheiro novo para pagar as dívidas, fazer uma oferta aos credores e começar uma vida nova. Se nada acontecer, teremos que pensar em recuperação judicial sim. Não podemos ter despesas de R$ 10 milhões mensais e arrecadação de R$ 800 mil. Vão faltar R$ 9,2 milhões todo mês.
“Até me questionei se valia a pena manter o clube de pé esse ano ou encarar de vez a realidade. Tem horas que você acerta, tem horas que erra, foi o que a gente conseguiu fazer. Estamos deixando algum patrimônio para o clube. Só jogadores jovens. Precisamos de um técnico mais experiente talvez nesse momento”
– Se já tivéssemos separado o clube do futebol, o presidente eleito só cuidaria do clube. Agora o presidente eleito vai ter que conduzir o processo, acompanhar o projeto do Gustavo e depois partir para a recuperação. Eu estou ajudando o Gustavo como posso.
– O Gustavo já preparou o workshow, já está “atacando” várias pessoas. Ele está trabalhando muito nisso. Os R$ 126 milhões só ficam no modelo 1. Os R$ 54 milhões podem aderir ou não o modelo 2. Aproveitamos algumas coisas, como formato, dívidas registradas, proposta aos credores. Traduzimos para o inglês. A dívida levantada pelo Laércio, um trabalho primoroso, será aproveitada, porque infelizmente dívida não muda. Se tudo fosse reanimado, acho que não teriam desistências nesses R$ 54 milhões, também não sei se entrariam no projeto do Gustavo. Ele está fazendo uma coisa que o projeto 1 não fez. O Botafogo é uma Ferrari que está na lama. Se parte do projeto é pra pagar credor e a outra parte é pra custeio, se temos mais ou menos o valor para ofertar aos credores, por que não ofertamos? Por que desistir antes de tentar? O Gustavo pensa assim e acha que as ofertas têm que ser feitas, ele está caminhando bem com os credores e está bem assessorado por advogados, até pelo André Chame. O dinheiro vindo, a parte com os credores estará adiantada.
– O Rio de Janeiro é a única cidade do mundo que tem quatro times grandes convivendo numa cidade que sofre dramaticamente há muito tempo. Tudo é mais difícil, o Rio já é esvaziado, ainda veio uma pandemia, tudo é complicado: patrocínio, despesa de estádio, torcida. O nosso problema é receita. O Botafogo está com problemas há muito tempo, não há renovação de torcida. Depois de muita luta, conseguiu-se esse patrocínio anunciado na semana passada, ideia interessante que tinha a ver com o momento, o cara trouxe o certificado da Anvisa e, de uma forma esquisita, duas horas e meia depois de anunciado a Anvisa cassa. Não sei o que é, só não acredito em coincidência. Estamos conversando, a Anvisa parece que vai resolver. Não sabemos porque deram a licença e porque cassaram. Se alguém tiver um patrocínio melhor pode trazer.
Recuperação judicial
– Na recuperação, em vez de fazer oferta aos credores, o Juiz nomeia um gestor, suspende as penhoras, começa a arrumar a casa, tem parte do dinheiro para custeio e parte pra dívida, seria um último estágio antes da falência. Não é o que me agrada, não é o que busco. Estou focado no projeto do Gustavo e sou Gustavo até a morte. Não é uma coisa que me amedronta, em último caso temos que encarar, não temos verba disponível, o que temos está sendo usado pra pagar salário, mas não paga imposto, não paga conta, não paga custeio. Para o Botafogo jogar contra o Cuiabá, custou R$ 65 mil. A gente não tinha. Se a recuperação for garantida por Lei, melhora mais ainda, outros clubes vão entrar também. Eu não entendo muito, mas tenho um advogado craque nisso, todos estão aguardando a lei ser aprovada no Senado.
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