A cena do presidente da Vale ao lado de diretores da empresa na entrevista coletiva de terça-feira, 29, fez lembrar imagens do julgamento de líderes nazistas em Nuremberg.
Menos mal que aqueles responsáveis por uma das maiores carnificinas da humanidade foram condenados à morte, prisão perpétua ou muitos anos de cadeia. Infelizmente é difícil acreditar que algum desses chefões da Vale vá parar na cadeia.
Foi a segunda entrevista desse presidente da empresa depois do Córrego do Feijão ocupar as manchetes. Na primeira ele veio com a conversa mole parecida com a do presidente da Samarco em Mariana. Nessa foi totalmente diferente, com semblante sério e assustado. Certamente movido pela pressão internacional, que levou à queda das ações da empresa no mundo. A única coisa que incomoda e mexe com executivos e empresas desse porte.
Temos um ex-presidente da república e ex-governadores de distintos partidos políticos presos, mas nenhum diretor de mineradora.
O destino desses executivos cruéis da Vale deverá ser o mesmo dos da Samarco (aliás, empregados deles), que mais de três anos depois dos crimes em série cometidos em Mariana, continuam impunes. Nem as multas, nem as indenizações às famílias e cidades atingidas foram devidamente pagas. Tomara que estes cinco “bagres” ou bodes expiatórios presos em São Paulo e em Minas Gerais, abriam o bico e entreguem os chefões.
A verdade nua e crua é que, no mundo, só há uma indústria cujo poder pode ser comparado ao das mineradoras e sua cadeia produtiva: a bélica. Seus executivos só visam o lucro, onde os fins justificam os meios. São empresas que não têm rosto, não têm um culpado verdadeiro para apresentar em casos de crimes como este cometido em Brumadinho e tantos outros. Compram consciências, compram pareceres, licenças, sentenças, enfim. Dominam as comunicações, direta e ou indiretamente. Chegam mansinhas às comunidades em que vão operar, conquistam a confiança das sempre desinformadas e de boa fé populações, muitas vezes manipuladas pelas lideranças políticas locais, que entram no jogo, e se instalam. Fazem jorrar dinheiro miúdo no comércio, geram empregos mal remunerados, doam uma graninha para as quermesses, patrocinam reformas de igrejas, um centro de saúde aqui, um arremedo de hospital ali. Apoiam festas tradicionais locais, com cartazes e algum show barato, e pronto. Se instalam. Para cidades e povoados “pobres”, que nunca viram tanto dinheiro, finalmente “Deus olhou por nós”, “estamos no paraíso”. Nem imaginam que o inferno é que está chegando. Tornam-se reféns e alvo de chantagens quando chegam as dragas, tratores, caminhões e a exploração incontrolável das minas de minerais raros e cobiçados pelo mundo inteiro. Ouro, manganês, bauxita, nióbio e até minério de ferro, o mais barato deles, usado como fachada para que toda a riqueza do subsolo brasileiro seja levado por preço de banana para o exterior.
Enquanto acionistas e executivos dessas multinacionais ficam cada vez mais ricos mundo afora, o chão de fábrica mais barato do planeta é esfolado em péssimas condições de trabalho e milhares de pessoas e a natureza padecem soterradas por crimes como este mais recente, o de Brumadinho.
Quando uma licença para operação não sai ou o Ministério Público aperta, eles ameaçam “ir embora”. Mobilizam comerciantes, trabalhadores e famílias que vão para as ruas em passeata. Incautos que se tornaram reféns, agora dependentes destes chantagistas que os fizeram acreditar que eram a salvação quando chegaram. Sempre contando com a cumplicidade ou incompetência de homens públicos e grande parte dos veículos de comunicação.
Itabira foi a primeira vítima dessa trama, denunciada em versos por Carlos Drummond de Andrade. As jazidas de lá estão se esgotando, mas há muitas outras na vizinhança. Conceição do Mato Dentro é a bola da vez. Descoberta primeiro por Eike Batista com a MMX, que a vendeu para a Anglo American, que conseguiu recentemente, numa velocidade impressionante, licença para o tal “step 3”, para minerar quase no centro da cidade. Leva as riquezas e a água, absurdo dos absurdos, via “mineroduto” de quase 600 km, por gravidade, até o porto de Açu, no Rio de Janeiro, passando por 32 municípios. Diferentemente da matriz da África do Sul, que constrói suas próprias estradas e ferrovias para transportar o minério explorado, aqui a Anglo usa “mineroduto”, muito mais barato, já que no Brasil tudo pode.
Em países onde a mineração também é forte, como a África do Sul, Austrália, Canadá e outros, normas ambientais e de segurança são rigidamente cumpridas. Barragens como essas utilizadas por aqui, não existem mais. Mas no Brasil tudo pode. Se não puder, compra-se!