Foto: @Atlético
Rodrigo Capelo é um dos melhores jornalistas especializados em finanças do futebol. Estudioso, excelente apurador e criterioso em suas análises. Claro que as verdades que ele apura, incomodam a muitos dirigentes e torcedores mais exaltados, como foi no caso dos cruzeirenses, quando suas reportagens sobre o caos iminente ganharam as manchetes da imprensa em todo o país.
Hoje, o Rodrigo divulgou números da obra do estádio do Atlético, cujo custo vai superar muito as projeções iniciais por uma série de fatores. Reportagem bem feita, mas tão logo foi publicada pelo Globoesporte.com, provocou reações iradas de alguns atleticanos.
Nada de anormal, já que a inflação fez os preços de material de construção subir e isso inclui as tão faladas “contrapartidas”, que são obras de infraestrutura e compensações ambientais, devidamente acertadas entre o Atlético, a prefeitura e demais instâncias públicas. Nada fora do que a lei exige. Afinal, se não houvesse estádio, não haveria necessidade de novas ruas, avenidas, viadutos, pontos de ônibus, contenções de encostas, etecetera e tal. E nem haveria nenhuma obra ali, já que se tratava de uma área de preservação ambiental.
Obra particular, sujeita a enquadramento como tal pela prefeitura. E diferente também de novos estádios semelhantes, como o do Corinthians, Grêmio, Palmeiras e outros país afora, que foram construídos no período em que estava em vigor, lei federal, que os eximia de muitos impostos, como parte do pacote de incentivos para a realização da Copa do Mundo de 2014.
Depois de ler a reportagem, continuo com a mesma convicção de quando o então presidente Daniel Nepomuceno anunciou que o Galo iria, finalmente, realizar o sonho de ter o seu próprio estádio: um grande negócio para o clube, que se bem gerido dará grande retorno, financeiro e esportivo.
No twitter, o Capelo já preparou o espírito dos mais exaltados, que acham, erroneamente, que a reportagem é negativa para o Galo, ou embarcam em alguma conversa fiada do mundo digital:
@rodrigocapelo
“Bobagens estão sendo ditas sobre o financiamento da arena do Atlético-MG, consequência das ilações feitas por “influenciadores”, depois que publicamos reportagem sobre o assunto no @geglobo. Alguns torcedores repetem argumentos equivocados, mesmo sem entender nada. Se liga aí.
Sei que o torcedor fica irritado com provocações de rivais e pega qualquer argumento pra se defender. O “influenciador” sabe disso e se faz assim, espalhando burrice com convicção para ganhar seguidores, bajular dirigentes e faturar um trocado. Cuidado! Quem perde nessa é você.”
A reportagem:
* “Atlético-MG busca R$ 240 milhões em crédito para concluir obras da arena; entenda o fluxo do dinheiro”
Se projeções financeiras da diretoria alvinegra estiverem precisas, a dívida de R$ 440 milhões, acumulada para financiar a construção, deverá ser quitada em setembro de 2029
Por Rodrigo Capelo
O Atlético-MG ainda está no mercado à procura de crédito para concluir a construção de seu estádio. A diretoria alvinegra busca a segunda rodada de investimentos, no valor de R$ 240 milhões, quantia necessária para cumprir o cronograma e encerrar o empreendimento em outubro.
O custo total do estádio superou a previsão inicial, dos R$ 410 milhões estimados no início do projeto, cinco anos atrás, para os atuais R$ 926 milhões. Apesar dos esforços de dirigentes e empresários para levantar recursos nesse meio tempo, falta dinheiro para a conclusão da obra.
O ge obteve cópia do material confidencial entregue por representantes atleticanos a potenciais investidores. Nele, há detalhes sobre o orçamento da Arena MRV, o fluxo de caixa e a captação do novo crédito.
Esses R$ 240 milhões serão captados por meio da negociação de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). Esses títulos de dívida estão lastreados nas receitas da própria arena, ou seja, a garantia de pagamento está na arrecadação dela por meio de cadeiras e camarotes.
Caso a operação seja bem-sucedida, será a segunda desta natureza. Em dezembro de 2021, o Atlético-MG obteve outros R$ 200 milhões por meio da comercialização desses certificados. Quem investe nesse tipo de título recebe o retorno sobre o investimento, com juros, ao longo dos anos.
Em ambas as emissões, existem prazos de carência. Ambos foram alinhados para que o estádio só comece a remunerar seu investidores a partir de outubro de 2023, meses depois do início da operação da Arena MRV, cuja inauguração está prevista para março do ano que vem.
O custo da obra
No material produzido para potenciais investidores, o Atlético-MG detalha o orçamento da Arena MRV, hoje estimado em R$ 926 milhões. A reportagem consultou pessoas próximas ao negócio para compreender a natureza de cada um dos números, resumidos do seguinte modo:
- R$ 639 milhões – Racional Engenharia
- R$ 150 milhões – Contrapartidas públicas
- R$ 43 milhões – Demais custos
- R$ 28 milhões – Autorização de Serviços Adicionais
- R$ 66 milhões – Tecnologia
Em relação ao estádio e sua estrutura, custos aumentaram por causa da inflação de materiais, como aço e concreto, e por mudanças no projeto arquitetônico. O estádio atleticano teria 41 mil lugares, por exemplo, capacidade posteriormente elevada para 46 mil.
Nas contrapartidas públicas, entram exigências feitas pela Prefeitura de Belo Horizonte em relação a vias de acesso, custos de licenciamentos e contribuições sociais e ambientais.
A Autorização para Serviços Adicionais diz respeito a itens que não puderam ser projetados com antecedência, como o local exato para a captação do esgoto, além de mudanças no projeto original.
No campo da tecnologia, os gastos também subiram. O escopo original previa a instalação de 100 câmeras de segurança, quantidade elevada para 300. Outro exemplo está na conectividade. Inicialmente, haveria 40 pontos de acesso para internet. O estádio deverá ser concluído com 900.
De onde vem o dinheiro
A soma de esforços de dirigentes do Atlético-MG e empresários atleticanos resultou na obtenção de R$ 511 milhões, até dezembro de 2022. Esse dinheiro se divide entre as origens da seguinte forma:
- R$ 21 milhões – Doação do terreno
- R$ 278 milhões – Aporte do Atlético-MG
- R$ 43 milhões – Naming rights
- R$ 169 milhões – Cadeiras e camarotes
O dinheiro aportado pelo clube de futebol é oriundo da venda da primeira metade do Diamond Mall, em 2020, shopping que a associação detinha em bairro nobre de Belo Horizonte.
Tanto a doação do terreno quanto a comercialização do direito de nomear o estádio, adquirido pela construtora MRV, têm a participação direta dos empresários Rubens e Rafael Menin. Eles doaram o local no qual está sendo construído o estádio e são donos da empreiteira.
Faltou dinheiro para que a obra fosse finalizada. É por esse motivo que a diretoria atleticana foi ao mercado em busca de crédito. As duas emissões de CRI, descritas na abertura deste texto, foram organizadas para que fossem levantados o restante dos mais de R$ 900 milhões necessários.
O Atlético-MG acaba de concluir a venda da outra metade do shopping, em operação que deverá render R$ 340 milhões. A diretoria do clube pretende usar esse recurso para abater dívidas do próprio clube de futebol. A chance de o dinheiro ser usado nas contas do estádio, segundo interlocutor consultado pela reportagem, é “absolutamente zero”.
Dívidas e consequências práticas
Em relação à engenharia financeira, a Arena MRV tem diferença na comparação com outros estádios recém-construídos ou reformados, em particular com aqueles usados na Copa do Mundo de 2014. Não há dinheiro público. O estádio está sendo levantado com recursos próprios.
Consequentemente, parte relevante do dinheiro da arena, que poderia ser investido em futebol no decorrer de quase toda a década de 2020, precisará ser redirecionada para o pagamento desta construção.
Os créditos já obtidos e ainda em fase de negociação – R$ 200 milhões e R$ 240 milhões, respectivamente –, são dívidas que a diretoria atleticana está fazendo para viabilizar o financiamento.
Essas dívidas consumirão recursos oriundos de bilheterias, sócios-torcedores, camarotes, cadeiras cativas, vagas de estacionamento e explorações comerciais do estádio, como patrocínios.
Caso o planejamento financeiro saia de acordo com o que calculam dirigentes atleticanos, a dívida do estádio será totalmente quitada em setembro de 2029. Esta é a data do último pagamento aos investidores que hoje adquirem os certificados. O lucro do estádio estará totalmente livre só a partir de 2030, para que então possa ser usado pelo futebol.
@rodrigocapelo
https://ge.globo.com/negocios-do-esporte/noticia/2022/08/30/atletico-mg-busca-r-240-milhoes-em-credito-para-concluir-obras-da-arena-entenda-o-fluxo-do-dinheiro.ghtml