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Ecos do Passado no futebol e na imprensa: de Guará a Déa e Luiz Carlos Januzzi

O saudoso Luiz Carlos Januzzi (esq.), Emanuel Carneiro (Rádio Itatiaia) e o jornalista Rogério Perez, na entrega do Troféu Guará em 1995. Luiz foi um ótimo jogador do Democrata e era filho do Guaracy Januzzi, o famoso Guará o “Perigo Louro”, artilheiro do Atlético, que foi obrigado a parar precocemente com o futebol. Empresta o nome ao maior prêmio do futebol mineiro, promovido há 53 anos pela Itatiaia.

* * *

Numa caminhada pela Serra do Cipó dia desses tive o prazer de me encontrar com a Déa Januzzi, um dos grandes nomes do jornalismo mineiro, famosa pelas reportagens e colunas durante décadas no Estado de Minas. Figura humana fantástica, aposentou-se e hoje mora numa aconchegante casa em Cardeal Mota, distrito de Santana do Riacho, onde está o principal ponto de partida para o turismo na Serra.

Déa-Januzzi-33

Déa é filha daquele que se transformou uma das maiores lendas do futebol brasileiro, Guará, imortalizado pela sua raça, gols e amor ao Atlético e pela iniciativa do Januário Carneiro (fundador da então recente Rádio Itatiaia), que batizou a maior premiação aos melhores do futebol mineiro com o nome dele. Guará era artilheiro de média de quase um gol por jogo, mas parou com o futebol muito novo, aos 23 anos, em função de um choque de cabeça com o zagueiro Caieira, do Cruzeiro, no estádio de Lourdes.

GUARA

O nosso maior clássico começava ganhar os contornos atuais e essa é uma das histórias mais dramáticas, que vale a pena ser lembrada (http://www.galodigital.com.br/enciclopedia/Guaracy_Januzzi).

Um resumo de quem é a Déa está neste blog, da Maya Santana – http://www.50emais.com.br/premio-merecido-para-uma-jornalista-excepcional-3/ – porque eu quero falar mesmo neste post é sobre o irmão dela, Luiz Carlos, que foi um grande amigo e que nos deixou em maio de 2014, também precocemente. Sou amigo dos filhos dele, Eduardo e Kal, e semanas atrás publiquei esta foto (destaque do alto do post) de 1995 em minha coluna no jornal Sete Dias. Mas o espaço no impresso é pequeno e aqui temos espaço à vontade para “falar”. E deixarei a maior parte dessa fala para uma outra grande figura, a quem admiro muito e a quem sou muito grato: José Augusto Faria de Sousa, um dos pioneiros da imprensa esportiva de Sete Lagoas, apesar de ser curvelano da gema. Veja que belíssimo texto que o Zé Augusto escreveu em homenagem ao Luiz, poucos dias após a morte dele e publicado por nós na edição do dia 15 de maior de 2014:

* “À MEMÓRIA DE LUIZ CARLOS JANUZZI”

José Augusto Faria de Sousa

Único filho homem de um gênio do futebol (o consagrado e legendário Guará – Guaracy Januzzi), eterno ídolo  e símbolo do Clube Atlético Mineiro, desde muito  cedo Luiz Carlos  já estava seguindo as pegadas do pai,  nas categorias de base do clube alvinegro,  onde  o genitor se consagrara.

E vivendo num clube onde sobravam estrelas, que lhe tiravam a chance de projetar-se na sua arte, Luiz Carlos acadou cedido ao nosso Democrata  Futebol Clube, que também experimentava  um momento de  esplendor da sua grandeza, no profissionalismo..

      Juntamente com as chuteiras, trouxe consigo um modesto emprego de Mensageiro do  ex-IAPI (Insituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários), que ganhara nos tempos do Atlético,  para ajudar na sua manutenção de moço pobre.

Voltado para o objetivo da carreira de jogador profissional, não comparecia ao trabalho, na repartição pública, tendo as faltas abonadas pelas chefias, pois, aquele emprego humilde, era apenas uma ajuda de custo para o futuroso craque, sendo a situação comum naqueles tempos em que o futebol não gerava as riquezas de hoje…

            Aqui, na cidade pequena, onde a rivalidade era quase insuportável, a coisa não funcionou do mesmo jeito… (rivalidade histórica do Democrata com o Bela Vista).

            Sua falta de assiduidade ao trabalho foi denunciada e, como não poderia deixar de ser, organizaram uma Comissão de Inquérito, para apurar o abandono de emprego…

Foi exatamente naquela época que entrei na vida de Luiz Carlos, construindo, entre nós, uma bem cimentada e sólida amizade, a qual aumentou no correr dos tempos…

Fui ao velho estádio “José Duarte Paiva”, acompanhado de um grande amigo de Luiz Carlos, e o chamamos a um canto, dando-lhe conhecimento do  que estava para acontecer…

Ele mostrou-se atordoado, pois o dinheiro pouco, do serviço público era indispensável à sua subsistência.

Orientado, foi imediatamente para Belo Horizonte, onde lhe armaram um esquema para abortar o alegado abandono de emprego, e a estratégia deu certo!

A partir do dia seguinte, antes que a comissão de inquérito chegasse à agência local do IAPI, Luiz Carlos foi licenciado pelo Democrata, passando a comparecer ao trabalho, assinando religiosamente o livro de presença, no início e término do expediente…    

Quando a tal comissão chegou, encontrou-o em pleno exercício de suas funções, derrubando, assim, a finalidade da expedição punitiva…

 Luiz Carlos continuou treinando futebol, em horários alternativos, e deu curso à sua carreira de atleta, e, com incrível rapidez, foi conquistando a amizade e o respeito de todos nós.  Afinal de contas, era um cavalheiro, da mais fina educação.

Com pouco tempo, para flexibilizar o seu horário no IAPI, dei-lhe a tarefa de revisar, à noite, nos próprios nosocômios, as contas médicas do Hospital Nossa Senhora das Graças e do Hospital Santa Mônica, ambos da cidade, além de conferir as faturas do Hospital Dr. Pacífico Mascarenhas, de Caetanópolis.

Quanta responsabilidade! Que exação no cumprimento do dever! Que zelo com os interesses da repartição! Que excelência dos serviços prestados, além de granjear a amizade e o respeito dos hospitais, da classe médica e dos servidores das instituições hospitalares.

Enquanto isso, o serviço público ganhava um magnífico servidor, no mesmo passo em que os estádios do Brasil  podiam continuar vendo  a elegância de Luiz Carlos, no manejo da bola, à qual dispensava o trato fino  de um gentil-homem, cortejando a mulher amada…

Desfilava entre os outros astros do Democrata, daqueles tempos gloriosos, como um verdadeiro príncipe, e mostrava, nos estádios e na vida social, toda a finesse da sua personalidade e da educação esmerada, que eram suas características principais.

Para não gostar muito de Luiz Carlos, era preciso não conhecê-lo!

Convivemos de perto durante muitos anos, até que os janeiros nos conduzissem à aposentadoria. Ouvi dele as suas estórias de amores e dissabores. Pude ampará-lo, moralmente, quando solicitado, nas suas horas de maior amargura e de grandes decepções…

            Nossos filhos (Rodrigo e Eduardo) foram meninos inseparáveis. Tenho um Eduardo, na minha casa, que foi uma homenagem ao filho de Luiz Carlos e Simone, que foi tão amiga de minha pranteada mulher…

 Aqueles dois meninos desenvolveram asas e voaram para a vida que se abriu diante deles… Hoje, são homens vitoriosos e de bem!

De vez em quando, nos encontrávamos pelas ruas desta cidade, que escolhemos para nossa terra…

Trocávamos reminiscências. Falávamos da vida e remetíamos a memória para a saudade daqueles que tanto estimamos e que não mais estavam conosco…

Na manhã de 11 de maio, fui vê-lo pela derradeira vez, na sua urna mortuária. Meus olhos que quase não vêem mais, consumidos pelo glaucoma, e as lágrimas, que mais ainda os embaçavam, nem deixaram que eu visse o seu semblante, na hora derradeira…

Mas tenho certeza de que estava diante de um homem bom, repousando da dura lida, e que partiu levando uma imensa legião de admiradores e amigos…

Viajou para sempre Luiz Carlos Januzzi, um homem que foi simples, leal e amigo!

Para sua mãe, irmãs, e, especialmente para Eduardo, Cláudio e Maria do Carmo, que mais de perto conviveram comigo, o meu abraço.


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Comentários:
3
  • Bernardo Montalvão. disse:

    É sempre assim, usam a bela história do Atlético pra ter audiência. Mas nunca dirigem críticas ao time azul. E viva a Itatizeiro!

  • Thiago Magalhães disse:

    Para a garotada que acha que Dátolo é ídolo, recomendo pesquisar sobre a história de jogadores como Mário de Castro, Guará, Nicola, Mexicano, Zé do Monte, Kafunga, Lucas Miranda, Carlyle, Ubaldo, etc…

    “… um astro que parou de brilhar no velho engaste azul do firmamento, mas cujo esplendor ainda penetra nossos corações onde vive e viverá a saudade.”, Ari Barroso sobre Guará.

  • José Eduardo Barata disse:

    Muito bom ler textos assim, num momento de pouca ou nenhuma inspiração emotiva numa imprensa árida como a que temos hoje.