Aproveitando que a bola ainda não está rolando pelos gramados do país afora, vamos divagando e filosofando sobre coisas importantes para o nosso dia a dia.
Falar em ética é complicado, principalmente no Brasil, onde a “Lei de Gérson” vigora em todos os cantos do país, em todas as atividades profissionais.
Jornalista se depara com situações delicadas e vejam que exemplos interessantes; um vivido por mim, e outro, envolvendo grandes nomes do jornalismo mundial, focados na fotografia.
O assunto vale também para leitores trogloditas, sem educação, infelizes, que para discordar de alguém, agridem, baixam o nível e não há outro caminho que não seja a lixeira ou o spam para suas mensagens; para nunca mais serem lidos.
Gosto demais do diálogo com leitores, principalmente nas divergências, pois enriquece o debate, gera conhecimento mútuo e no fim, tudo se acerta, quando há bom senso e inteligência.
E, modéstia às favas, o nível da maioria absoluta dos meus leitores, é da prateleira de cima.
No dia 26 de novembro do ano passado, publiquei os maiores salários dos treinadores do mundo e do Brasil.
Dia 27 o Guilherme Lopes, que ainda não tive o prazer de conhecer pessoalmente, escreveu-me:
* “Ô Chico, estava com o comentário abaixo pronto para ser enviado para o seu blog. Como falei mais cedo com outros dois jornalistas, segue o que eu iria publicar no blog, mas preferi enviar somente para você.
Ô Chico, não faz isso. Sempre te achei um cara sensato.
Você pode não concordar com os valores, não achar mérito ou outra coisa.
Mas daí dar eco, ficar republicando valores de salários de funcionários de instituições privadas, não é legal.
Isso compete a quem recebe e quem paga.
Acho uma falta de privacidade e ética.
Será esse o papel do jornalismo?
O que você acha?”
Guilherme Lopes
Respondi a ele:
Pois é, Guilherme!
Pensei nisso também antes de escrever.
Mas depois de ouvir em todas as rádios possíveis e ler em todos os sites e portais dos maiores veículos de comunicação do país, republiquei.
Mas o seu questionamento é totalmente válido porque abre o debate.
Os técnicos trabalham para instituições privadas, mas existe coisa mais pública que um clube de futebol no Brasil?
O que você acha?
Vamos trocando idéias, pois isso pode render uma coluna inteira nessa época de fim de ano quando a bola para.
Ótima discussão; ótima pauta.
O Guilherme replicou:
* “Ô Chico, fiquei feliz com a sua reflexão e resposta. E claro que vamos debater.
Só que nos próximos 12 dias terei acesso limitado, e também não vou querer ficar conectado, pois estou indo visitar Lisboa e Madrid.”
No dia 11 de dezembro o Guilherme voltou a me escrever:
* “Ô Chico!
Cheguei de viagem agora.
E aproveitei bastante as duas capitais!
Os destaques de Lisboa foram os tradicionais pastéis de Belém, a região do Parque das Nações e o bacalhau! Aproveitei para assistir umas apresentações de fado gratuitas na FNAC. E lá, um português muito simpático, o seu Augusto, me indicou o restaurante que ele come o bacalhau.
O pão, vinho, bacalhau, a sobremesa e o café. Tudo bem farto, por 8 euros! Anota o nome do restaurante aí: Super Mário. É só lembrar do personagem do vídeo game.
Aproveitei também e fui assistir um jogo de futebol no estádio da Luz. Você já foi lá?
O jogo foi da equipe B do Benfica, contra a equipe B do Marítimo, e entre os brasileiros estava o atacante Alan Kardec, ex Vasco, Internacional e Santos.
Em Madri, além dos museus com M maiúsculo, o Museu do Prado e o Reina Sofia (aproveitei para visitar no horário gratuito, é só conferir no site) eu me esbaldei com as tapas. Visitei vários bares e restaurantes e sempre pedia no balcão uma caña (cerveja pequena) e que sempre vinha acompanhada de algum tira-gosto (as tapas). Excelente.
Cada cervejinha de 200 ml bem gelada vinha acompanhada de um pratinho. Algumas vezes eram saborosas azeitonas, batatinhas fritas, sardinnhas fritas, jamón e outras delícias.
E um dia, assistindo um pouco de TV portuguesa, vejo uma mesa redonda e o tema era: o salários dos técnicos de futebol.
Hehehe… até por lá!”
E no dia 16 de dezembro o Guilherme enviou um último e-mail sobre o assunto:
* “Ô Chico,
olha o que eu achei por acaso, e que tem relação total com a nossa conversa (e fora que é o atual técnico da seleção).
https://www.youtube.com/watch?v=-45S5cZDI9E
Por mais que o tom seja agressivo, eu imagino que ele pensou na família dele.
Abraço,
Guilherme Lopes”
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Detalhe importante: nem sei para que time o Guilherme torce!
Agora, vejam que interessante essa coluna da “ouvidora” da Folha de S. Paulo, no dia 9 de dezembro, coincidentemente, mesmo período em que eu e o Guilherme discutíamos sobre a validade ou não de se divulgar os salários dos treinadores:
* “Ombudsman”
SUZANA SINGER
O que você faria?
Foto de um homem prestes a ser atropelado pelo metrô levanta discussão ética sobre frieza da imprensa
Empurrado para os trilhos, Ki-Suck Han, momento antes de morrer
A imagem de um homem prestes a morrer atropelado por um trem de metrô está rendendo uma grande discussão sobre ética jornalística no mundo. O fotógrafo não deveria ter ajudado o homem em vez de ficar clicando? Faz sentido publicar uma imagem tão trágica?
Tudo aconteceu em 22 segundos. Na noite de segunda-feira passada, na estação de Times Square, em Nova York, um homem parecia discutir com um mendigo na plataforma. De repente, houve uma espécie de suspiro coletivo. Ki-Suck Han, 58, tinha sido empurrado pelo mendigo para os trilhos.
O fotógrafo freelancer R. Umar Abbasi estava lá, esperando a condução para cumprir uma pauta. Viu Han caído e começou a clicar. O trem se aproximava. A vítima tentou sair, mas não deu tempo.
A foto foi a capa do tabloide “New York Post” no dia seguinte, com a manchete, de extremo mau gosto, “CONDENADO”, seguida de “Este homem está prestes a morrer”.
Choveram críticas à atuação do fotógrafo e do jornal. Abbasi foi a um programa de TV para se explicar. Disse que não estava preocupado em fotografar o acidente, apenas usava o flash para chamar a atenção do condutor do trem. Desfiou outras justificativas: não teria dado tempo de ajudar Han, teve medo de ser empurrado também, não teria forças para puxá-lo.
Havia outras pessoas na estação, mas ninguém se mexeu.
A polêmica lembra a que envolveu a famosa fotografia da criança famélica espreitada por um abutre, tirada no Sudão em 1993. A imagem premiada, símbolo da luta contra a fome, tornou-se motivo de orgulho e tormenta para seu autor.

Kevin Carter era um dos quatro membros do Clube do Bangue-Bangue, apelido que a trupe de destemidos fotógrafos recebeu por seu trabalho na África do Sul, no período violentíssimo entre a libertação de Nelson Mandela (1990) e sua eleição para presidente (1994). O grupo registrou toda sorte de tragédias e ganhou fama internacional.
Questionado sobre por que não ajudara a criança moribunda, Carter deu diferentes versões: disse que não era preciso porque havia um centro de distribuição de alimentos perto dali, que enxotou o abutre, que ela se levantou sozinha… Um ano depois de ter produzido a imagem, Carter, que tinha vários problemas, inclusive com drogas, matou-se.
Como regra geral, repórteres e fotógrafos não devem intervir nos acontecimentos. O papel deles é registrar os fatos, o que não é pouco, principalmente em situações extremas como guerras e epidemias.
Mas existe, é claro, a linha da solidariedade humana, o momento quando se age por instinto para tentar salvar quem está ali.
Colega de Carter no Bangue-Bangue, João Silva estava no Afeganistão em 1994, quando ouviu uma explosão. Viu emergir da poeira um pai carregando o filho ferido. Em vez de clicar, correu para ajudar. A criança morreu no hospital.
Fotografar teria levado segundos, não mudaria o destino do garotinho e poderia ter rendido uma cena que comovesse o mundo. “Eram imagens de guerra muito boas, mas decidi não bater. Nunca tinha feito isso. Mas a morte da criança acabou tornando meio sem sentido o gesto humanitário”, escreveu o fotógrafo no livro “O Clube do Bangue-Bangue” (Companhia das Letras, infelizmente fora de catálogo).
Casos extremos como o de Nova York ou do Sudão alimentam a imagem de frieza da imprensa, de jornalistas como “eunucos éticos”, nas palavras de David Carr, colunista de mídia do “New York Times”.
Diante da imagem arrepiante do homem sem esperanças nos trilhos, a reação usual é apontar culpados: não apenas o sujeito que provocou o acidente, mas aquele que registrou tudo e ainda quem teve o sangue-frio de publicar. A foto incomoda porque transporta o leitor até a cena e o faz se perguntar “eu teria me arriscado a ajudar o homem?”
A melhor opinião veio de um “herói do metrô de Nova York”. Em 2009, o ator Chad Lindsey pulou da plataforma para retirar um homem que tinha caído na linha do trem. Em vez de condenar a atitude do fotógrafo, Chad lembrou o medo que aqueles trilhos provocam e disse: “Você nunca sabe como suas pernas vão reagir até serem testadas”.