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No dia dos 10 anos da conquista da Libertadores, uma entrevista sensacional do Alexandre Kalil, ao Ge

Foto:  ge.globo.com/futebol/times/atletico-mg

Parabéns ao Fred Ribeiro, Guilherme Frossard e Pedro Spinelli pelo excelente trabalho nessa conversa com o maior presidente da história do Atlético. Tantas histórias, de tantos detalhes até a chegada ao título, que ao terminar a leitura fica aquela sensação de frustração em saber que dificilmente o Galo terá outros Kalil, Ronaldinho Gaúcho e essa geração fantástica que deu a maior alegria de todos os atleticanos na história.

* “Atlético-MG: a toalha, a profecia e o “delay” de Alexandre Kalil no título da Libertadores há exatos 10 anos”

Título do Galo completa uma década nesta segunda-feira e aquece memória do ex-presidente

Há 10 anos, uma bola bateu na trave e explodiu a vida do Atlético, na conquista do maior título esportivo do clube. Aquele barulho histórico, entretanto, foi visto com alguns segundos de atraso – o famoso delay – pelo então presidente do clube, Alexandre Kalil. Ele acompanhou a decisão da Libertadores de 2013 dentro do vestiário do Galo, no Mineirão.

É um passado presente todos os dias no apartamento do nono andar de um prédio no bairro de Lourdes (o mesmo onde está a sede do Galo). Em sua casa, Kalil, hoje com 64 anos, recebeu o ge para relembrar aquela conquista da virada do dia 24 para 25 de julho de 2013. Justamente um dos maiores símbolos da conquista, justamente a bola que bateu na trave de Victor, está na memorabília de Kalil.

“Aquele dia foi um acúmulo de emoções para chegar no ápice. Acho que só caiu a ficha quando entrei no gramado Mineirão. Porque eu estava lá embaixo (no vestiário). Quando entrei no Mineirão, eu senti o tamanho da festa e o tamanho da emoção que eu ia sentir.”

Logo na entrada do apartamento, réplicas de tamanhos reais do troféu da Libertadores de 2013 e da Copa do Brasil de 2014, no crepúsculo da sua administração, iniciada em outubro de 2008. A taça original da conquista, inclusive dormiu com Kalil. Em um cômodo separado das salas de TV e de estar, há uma espécie de museu do Galo, ou de museu de Alexandre Kalil no Galo. Com referências ao seu pai, Elias Kalil, ex-mandatário entre 1980 e 1985.

Entretanto, há um objeto que não dialoga com o restante da decoração, ao menos visualmente. Mas é ele quem será o condutor do bate-papo no estilo “túnel do tempo” para a Libertadores de 2013. Trata-se de uma toalha de rosto rosa, devidamente esticada e enquadrada. Posição de destaque, ao lado da camisa de Ronaldinho Gaúcho devidamente preparada para a sua coletiva de despedida, em 2014.

Na entrevista, Alexandre cita várias vezes Elias Kalil. Falecido em 1993, o ex-dirigente do Galo chegou a profetizar, em 1983, logo após a conquista do hexacampeonato mineiro: “Agora que atingimos hexa, vamos ao Mundial”. Meta cumprida pelo filho, 30 anos depois. Na entrevista, Alexandre cita várias vezes Elias Kalil. Falecido em 1993, o ex-dirigente do Galo chegou a profetizar, em 1983, logo após a conquista do hexacampeonato mineiro: “Agora que atingimos hexa, vamos ao Mundial”. Meta cumprida pelo filho, 30 anos depois.

Alexandre Kalil segue tocando seus negócios pessoais, curte as cinco netas, alimenta sua paixão por motocicletas Harley-Davidson e ainda tem no currículo a prefeitura de Belo Horizonte (2017-2022), em dois mandatos. Recentemente, foi alvo de uma CPI (“Abuso de Poder”) na Câmara dos Vereadores.

No relatório final, realizado na sexta-feira, não houve imputação de irregularidades ao ex-chefe do executivo municipal. Um dos temas da CPI foi as contrapartidas da Arena MRV. O estádio, a Liga e até mesmo a votação da SAF do Atlético (aprovada na última quinta, seis dias depois da gravação da entrevista) são outros temas abordados por Kalil.

Alexandre beija a foto do pai, na galeria dos ex-presidentes do Galo na sede de Lourdes. Elias Kalil foi o presidente que modernizou o Atlético e pôs o clube no mapa do futebol mundial com as grandes excursões à Europa nos anos 1980.

LEIA A ENTREVISTA COM ALEXANDRE KALIL

Foto: twitter.com/ppedrospinelli

ge: Qual foi o primeiro pensamento após o título da Libertadores?

Kalil: “Não lembro (…) é muita coisa. Vem um turbilhão. Eu não lembro de nada. É um negócio completamente fora de contexto. Eu não esperava que o Atlético fosse campeão da Libertadores. Eu não esperava quando tudo começou. Isso demora pra gente. Primeiro que eu não estava no ambiente, eu estava solitariamente no vestiário do Mineirão (na final). Eu tive que me incorporar à festa pra começar a sentir. Eu lembro que eu estava com um filho do meu lado, o Felipe (Kalil, médico da Seleção), que é o mais velho, nós nos abraçamos na solidão do vestiário. Ainda mais nesse momento, vestiário fica vazio mesmo. Estava no vestiário com os dois roupeiros e o Felipe. Então, naquele momento, quando a bola explodiu… Antes de a bola explodir, eu escutei o Mineirão explodindo, porque tinha um delay da televisão do vestiário. Eu abracei, nos abraçamos, os roupeiros vieram também. Aí que nos fomos incorporar, sentir a festa.

E por que decidiu ver jogo no vestiário do Mineirão, pela TV?

– Por covardia. Eu estava apavorado. E eu estava com muito medo de perder. Nós tínhamos um 2 a 0 contra. Quem conhece de futebol sabe que dois contra… Então, fui pro vestiário por medo. Apavorado, fiquei lá trancado. O medo é uma coisa que você não compartilha. É tão vergonhoso que você fica sozinho. Meu filho só foi pro vestiário, não porque eu chamei, porque avisaram: ‘Seu pai tá no vestiário’. Deve ter acontecido alguma coisa. Aí, quando ele ficou e nós fizemos um gol, eu falei: ‘Agora você não vai sair. Vai ficar do meu lado’.

Houve algum momento que você teve aquela sensação de “deu merda”?

– O pênalti contra o Tijuana. Eu falei: ‘Não é possível’. É sina. O Atlético está condenado. Igual em mitologia. O Atlético está condenado a sofrer eternamente. Então, nós atleticanos estamos condenados ao sofrimento. Naquele momento, aquilo sim eu sei o que passou na minha cabeça. Nós estamos condenados ao sofrimento. É uma sina que vamos ter que cumprir (…) Aquela foi uma emoção porque é muito bom quando você vê tudo perdido e se recupera. Não era o caso de disputar o título. Aquilo ali, estava tudo perdido. E meu filho entrou na cabine e disse: “O Victor vai pegar o pênalti”. Pronto, tinha um doido do meu lado. Mas naquele momento, eu não tive esse pensamento.

E quando teve a defesa, veio essa sensação de que o Atlético seria campeão?

– Não. A Libertadores é um troço engraçado. O que eu senti e posso falar que horas que eu senti que poderia ser campeão (…) foi nos momentos que acabava o jogo. Então, isso foi acumulando na minha experiência de vestiário que não é pequena. O time entrava no vestiário, todo mundo feliz, batendo palma, rindo, brincando, mas era assim ‘não acabou’. Não acabou. Então, quando ganhamos do Newell’s de virada, pegamos pênalti do Tijuana, pegamos o São Paulo aqui e detonamos, destruímos o São Paulo. Isso tudo eu olhava assim: ‘Gente, está diferente’. Esse vestiário não ganha jogo, ele ganha título. Não é vestiário de ganhar jogo (…). Eu nunca deixei de descer no vestiário do Atlético. Nunca xinguei, nunca gritei, nunca falei nada. O Eduardo Maluf, saudoso e querido, falava: “A sua calma dentro do vestiário era impressionante”. Cansei de tirar o time do vestiário e levar pro CT pra gente conversar lá. Mas vestiário não é hora (…) se você está nervoso, triste, com raiva, todos ali estão. Não tem ninguém ali com menos raiva que você. Não é hora de conversar. Mas na hora que você ganha… Esse não é vestiário de ganhar jogo. É vestiário de ganhar título. E isso eu senti durante a Libertadores, e senti de verdade.

O Juvenal Juvêncio (então presidente do São Paulo) chamou o Independência de “arapuca”. Qual foi o peso do Horto naquele título?

– Total. Tenho uma lembrança muito forte. Quando eu entrei no sorteio de 2013, para começar a Libertadores, a televisão argentina veio me entrevistar e claro, tínhamos Ronaldinho, vice-campeões brasileiros, time que já estava sendo falado no mundo, porque o Ronaldinho trouxe atenção do mundo. Eu lembro como se fosse hoje. Veio a TV da Argentina e me perguntou: “É verdade que o Atlético Mineiro tem uma Bombonera em Belo Horizonte?”. Eu falei: “É verdade. Prepara, porque vocês vão penar lá dentro. É verdade, tempos uma Bombonera”. Acho que o Independência foi fundamental. Vamos inaugurar um estádio, tem que ter uma mística do time com a torcida. Concreto não dá nada pra ninguém. Aquilo é nosso lar, ali tem que ter felicidade.

“Porra, eu ganhei 97% dos jogos da minha gestão no Independência. Perdemos pro Coritiba na minha despedida do Atlético (…), perdemos para o Athletico-PR também. Eu me lembro das derrotas do Independência, de tão poucas. Então, não pode falar que não é importante.”

E aquela mística do “Eu acredito”. O que explica essa sintonia?

– Quem sou eu para explicar. Eu olhava e falava: ‘Que pena, vocês acreditam e eu não’. Eu não tenho essa fé que aquele povo tem. Eu sou atleticano que fui no embalo. Se vocês acreditam, quem sou eu pra não acreditar, também (…). Ali tá todo mundo sofrendo igual. Ninguém sofre diferente no campo de futebol. Eu fui presidente do Conselho, diretor de futebol, presidente. Hoje, só como torcedor, sofro igual. Futebol é um negócio difícil, complexo, e a gente começou a gostar daquele negócio. Estamos gostando disso, isso aqui tá bom, tá legal. E daqui a pouco transforma naquilo. Eu tentei levar a final para o Independência. Eu fui pro Paraguai, lutei desesperadamente para isso.

Você já disse que não apagou a luz do Independência contra o Newell’s. Na sua cabeça, o que aconteceu ali? Não estava nem chovendo…

– Quem apagou foi Deus. Mas, tem uma coisa: a luz virou a razão da virada do Atlético. Temos que lembrar que o Atlético é o time que pegou o Corinthians aqui e enfiou quatro no segundo tempo. Pegou o Flamengo e enfiou quatro no segundo tempo (na Copa do Brasil de 2014). Virava jogo no segundo tempo. Então, porque a gente não vai no seguinte: não era o preparo físico, não? Atlético fez gol no Olimpia aos 42 do segundo tempo. Não era perna não? Não foi o trabalho do Carlinhos Neves, não? A culpa é da luz? Futebol tem…

“Eu já sou doente com superstição em futebol. Se você colocar mais coisa na minha cabeça, eu vou enlouquecer (…) o time tinha uma perna maluca pra jogar (…)”

Mas você tem alguma suspeita da luz?

– Não, caiu mesmo. Caiu a luz e acontece. Mas não teve ninguém. Se alguém apagasse a luz sem me falar, eu matava. Porque eu expliquei na última entrevista (ao podcast do Estado de Minas) que o juiz podia acabar o jogo. Então, só se eles apagassem a luz pra acabar o jogo. Nós? De jeito nenhum.

Por falar em superstição, conte a história da toalha rosa que te acompanhou na Libertadores.

– Eu tinha uma funcionário muito querida, a Lindaura, um beijo para ela. Sempre arrumou minha sala, cuidava de mim. Independentemente da hora que eu saía da sede, ela estava lá. Num jogo, no primeiro jogo, no Independência (contra o São Paulo), ela botou uma toalhinha rosa (na mesa da cabine onde a diretoria assistia aos jogos no Horto). Ela disse: “Ah, isso é para o senhor limpar o rosto, ou apoiar o cotovelo”. Ganhamos o jogo. No outro dia, ela estava na sede, passando, eu falei: “Ô Lindaura, que toalha legal hein? Foi pé-quente”. Desse dia em diante, a toalha, em todo jogo da Libertadores, estava no mesmo lugar. Até que um dia, num jogo, posso estar errado, mas acho que foi contra o Newell’s, a toalha não estava. Eu falei: ‘Cadê minha toalha?’. A toalha não estava. Cadê a toalha? Eu fiz irem na sede, meu motorista foi na sede com alguém com a chave, não lembro de detalhes. E buscou a toalha! Por isso ela está num quadro aqui em casa.

“Então, se a luz (apagão no Independência) foi responsável pelo título, essa toalha tem a mesma responsabilidade que a luz”.

– Acho que todo atleticano tem essas manias, superstições. O meu pai tinha que ver um torcedor do Atlético que usava uma muleta, no Mineirão. Se ele não achasse o cara, o Atlético não ganhava. Ele ficava procurando. Se ele visse, o Atlético ganhava. É doença.

Uma cena marcante da final foi o presidente do Olimpia, ao seu lado, numa coletiva na manhã do dia do jogo, ter feito o gesto de “4” com os dedos, indicando o que já seria o tetra da Libertadores. São ingredientes de motivação?

– A Libertadores é automotivacional. Não tem essa de “Ah um jogador falou isso em Atlético e Cruzeiro, aí você usa”. Eu não. Eu fui presidente do Atlético. Mas o treinador usa, dirigente usa. Mas, Libertadores não tem nada disso. A Libertadores por ser Libertadores, está todo mundo babando na Libertadores. Não muda nada (…) eu nem olhei pra taça aquele dia. Eu comecei a ter trauma. Eu não olhava. Eu estava no vestiário no jogo do Olimpia, ela estava de lado, eu olhava pra ela de lado. Eu não gostava de olhar pra taça. Foi um negócio meio doentio. A Libertadores foi doentia.

Você não viajou para os jogos da Libertadores, certo? Exceto na final. É alguma fama de pé-frio?

– O Cuca me pediu para ir no Paraguai. “Tá certo”, respondi. E assim mesmo eu assisti ao jogo do vestiário. Porque eu achava que dava azar. Não é porque eu não queria. Se eu for, dá azar. Aí eu fui num Atlético x São Paulo que não valia nada, Atlético já era primeiro do grupo, já estava classificado, já era primeiro da Libertadores, não tinha mais jeito de perder. “Então vamos nessa, presidente”, falaram. Eu fui e o Atlético perdeu. Aí acabou. Aí no último jogo ele me pediu, falou que era importante eu ir, pro grupo e tal. Aí eu fui. E perdeu.

 

Como era a relação do presidente do Atlético com aquele elenco?

– Eu jantava com os jogadores, eu lanchava. Quando eu não concentrava, eu lanchava. Então, eu participava desde a saída da concentração, eu tinha meu lugar no ônibus, no corredor, primeira cadeira. O Cuca sentava ao meu lado, na janela. E sempre foi assim enquanto fui presidente. Eu tinha meu lugar. E eu participei de tudo, a gente participa de tudo. E isso que é o gostoso. Eu falo muito, gostoso é a bola. Se você não vive aquele momento delicioso que é o futebol, seja na vitória ou na derrota, é o momento mais agradável de ser presidente do Atlético. É a hora da bola, do futebol, do vestiário, conversar com jogador. Eu tinha uma distância, mas era respeitado e respeitava os jogadores do Atlético. Hoje, eu vejo nas entrevistas como eu era querido e não sabia. Graças a Deus. Mas sempre tive uma distância próxima deles. Qualquer coisa, pode me procurar. Porque são garotos, são meninos que precisam de ter um olhar respeitoso, mas íntimo, do cara que pode resolver seu problema.

E quão tenso foi vivenciar aquela final histórica no Mineirão?

– A gente estava indo pra final de Libertadores. 40 anos na fila de tudo. Se eu falar que era um jogo comum, não era. Agora, nós saímos escoltados da porta do CT por uma multidão até o Mineirão. Quando nós chegamos, e vocês têm a imagem! É um negócio que… a gente que estava no ônibus, sabendo que é a nossa torcida, dava medo! Imagina o adversário chegando. Eu comentei isso. Eu, que é minha torcida, tá aqui do meu lado, eu estou apavorado. Imagina o adversário quando entrar no Mineirão. É aquilo que eu falei no início. Nós estávamos no rumo da glória sem saber que estávamos. Então, estávamos indo disputar uma final contra um bom time, com resultado adverso. O clima é de quem vai disputar uma final.

E como o senhor enxergou o Ronaldinho neste contexto todo da final?

– Quando você lida com situações… “Ah, mas o Ronaldinho estava nervoso?’. Estava (ironia). Devia estar nervoso igual na Copa do Mundo quando ele ganhou a Copa (2002), devia estar nervoso na Champions League, quando ele ganhou na Champoions League (2006), devia estar nervoso nos 300 campeonatos que ele ganhou, e devia tá nervoso igual. Quer dizer, nervosismo zero! Porque ele tem um temperamento…

E tinha a história que ele prometeu dar uma cavadinha na cobrança de pênalti.

– Ele ficou o tempo todo falando dentro do CT: “Eu vou cavar, não deixa o pênalti chegar em mim que vou cavar”. Não tem coração que aguente. Então, ele é muito competitivo tá? Ao contrário do que todo mundo acha. É líder nato. Sem bater na mesa, sem gritar, com o jeito manso dele, ele liderou os jogadores. E nunca pediu uma agulha pra mim, que não fosse pra todos os jogadores. Por isso ele é líder. Isso quando ele não vinha pra me pedir algo específico pra um jogador ou outro, caso de aperto que precisava. Então, esse jeito que todo mundo pinta o Ronaldo, ele foi o grande líder da Libertadores. Talvez o maior líder dessa Libertadores.”

Como foi a decisão de escolha dos batedores? O Atlético tinha Guilherme e Alecsandro que, não sendo titulares, eram ótimos cobradores de pênalti.

– Quem ia bater eu não sabia. Mas é um caso interessante que ninguém nunca levou em consideração: aquele time do Atlético só tinha batedor oficial dos times. O Alecsandro era batedor oficial do time que ele jogava (Vasco), o Guilherme era batedor oficial, o Ronaldinho era batedor oficial do time que ele jogava, e o Jô era batedor. Então, são cinco, quatro eram batedores dos seus times de origem, né? Então, ganhamos duas disputas de pênaltis. Só que eram todos batedores de pênalti (…) é muita coisa que vai conspirando. É uma conspiração do bem, total.

Tem a história que o Ronaldinho falou que você prometeu uma estátua para ele…

– Eu já prometi umas 50 estátuas. “Se você fizer dois gols no Cruzeiro, você ganha uma estátua”. “Se você for campeão, tem uma estátua”. Então, é tudo mentira. Vou fazer estátua pra ninguém (…) Eu prometi pra todo mundo. Porque quando contratei o Ronaldinho, falei “se você ganhar uma Libertadores, vou fazer estátua pra você”. Uai, podia prometer! Quem vai imaginar que nós vamos ganhar uma Libertadores lá em 2012? No início de 2012! Então foi isso. Eu prometi, é verdade, mas não cumpri. E não vou cumprir porque agora não posso mais. Devo, não nego e não pagarei.

É o título mais importante da história do Galo?

– Olha, eu acho que tomou uma dimensão… Provavelmente, é o título mais importante. Mas, todo título é importante. Eu fiquei, o Atlético foi bicampeão brasileiro. Não tem importância? Há pouco tempo atrás o Atlético não tinha nada. Agora o Atlético já acumula (…) uai, pera aí. Agora nós temos galeria. Eu disse e vou repetir. Não faz o Atlético nem maior e nem menor. Mas, é bom pra burro. “Pera aí: você é do Mineiro? Sou do Mineiro”. Sou bicampeão brasileiro, tenho duas Copas do Brasil, uma Libertadores, duas Conmebol, tenho 40 e tantos Mineiros, tem isso e tem aquilo.

Se o Alexandre Kalil de 2023 voltasse no tempo 10 anos atrás, qual seria o recado para o Kalil de 2013?

– “Você mereceu. Você sofreu tanto que mereceu”

Essa Libertadores tem algumas coisas bastante simbólicas. O lance que o Ferreyra escorrega sozinho, depois de driblar o Victor, com o gol vazio…

– Papai (Elias Kalil) puxou o pé dele. O do Victor (defesa de pênalti) até que papai não colocou o pé, não. Mas do Ferreyra foi papai. Ninguém me tira isso da cabeça. Não tem a luz? Não tem a toalha? Pois é. Quem puxou o pé do Ferreyra foi meu pai (…) isso é futebol. Se futebol fosse “olha aqui, vamos fazer isso e aquilo…”. Alguém me falou um dia: se futebol fosse startup, bota uma gravata e vai lá e explica o inexplicável, vai lá e explica o que ninguém pode explicar. Futebol é outro negócio! Futebol é outra coisa. Futebol não é pra quem gosta, futebol é pra quem sabe. Só isso. Não é pra quem gosta.

Elias Kalil em foto da Galo Digital

Você, sempre que perguntado, deu a mesma resposta. Mas repetiremos: se considera o maior presidente do Galo?

– Não. O maior presidente da história do Atlético é o Elias Kalil. Isso aí. Eu pus o Atlético em uma vaga que era dele. Mas, quem arrumou essa vaga lá em cima foi o Elias Kalil. Eu só fui lá e devolvi. A vaga estava guardada pra gente.

Você acompanhou de perto o período do Elias na presidência, certo?

– Ao lado dele. O papai era ambicioso em matéria de Atlético. Completamente “megalomaníaco”. Tinha essa qualidade. Ele era simples pra tudo na vida. Quando falava de Atlético, era “megalomaníaco”. Quando ele saiu do Atlético, eu tinha 24 anos. Imagina que corneta na cabeça dele. Um rapaz falando igual papagaio. Fiquei louco quando ele trocou Paulo Isidoro pelo Éder. Éder era reserva no Grêmio.

Como Elias Kalil comemoraria essa Libertadores?

– Pensei tanto no papai nessa Libertadores. Tanto. Porque a dele foi tomada, né (se refere a 1981). No apito. No apito! Isso que falei. É uma sina. Naquele pênalti do Tijuana, isso é sina. Nós estamos condenados! Então, eu tive muito, eu lembrei muito dele. Era um apaixonado pelo Atlético. Louco pelo Atlético.

Você vê a chance de algum filho ser presidente do Atlético?

– Enquanto eu for vivo, não.

Mas você conversa isso com eles?

– Já tem essa ordem. E eles são meninos obedientes. Enquanto eu for vivo (não). Quando eu morrer, aí cada um toma conta de si.

Se importaria de falar da atualidade do Atlético?

– Me importaria. Mas depende do assunto.

São vários, perguntaria primeiro da SAF.

– Não, não falo. Eu não tenho nada com isso. Não me chamaram para nada, não sei de nada, e não vou ser leviano. Tudo que eu for falar aqui, seria “achismo”. E eu não costumo falar de Atlético por meio de “achismos”.

O senhor é conselheiro grande benemérito. Portanto, foi convocado, assim como todos, para participar do processo da discussão da SAF. Pretende ir dia 20 na votação? (A entrevista foi realizada uma semana antes da votação)

– Não. Não vou atrapalhar.

Mas o que seria “não atrapalhar”?

– Não vou atrapalhar. Eu não sei o que é bom e o que é ruim. Quem sabe, vai lá e vota.

Como conselheiro, o senhor não tem interesse de saber como está essa situação?

– Não. Eu quero paz na minha vida. Até aqui, o que vocês falaram me dá um grande prazer. Quem pariu Matheus vai lá e embale. Não quero ser agredido, já me ofenderam demais, fizeram de gato e sapato com a minha honra, minha dignidade. Estão de mão amarrada comigo. Não me interessa. Não quero dar oportunidade para torcida, diretoria, para quem for, para falar se eu atrapalhei ou ajudei. O que eu tinha que fazer pelo meu clube, eu já fiz. O que eu tinha que fazer pelos meus filhos, eu já fiz. Não me intrometo na vida do Atlético, o mundo mudou e eles sabem lá dentro o que tem que ser feito. Não vai sair da minha boca notícia para ser manchete de jornal.

É uma decisão que a relação do Kalil com o Atlético será de torcedor?

– Eu tomei essa decisão em 2014. Eu mereço! Vocês acabaram de falar aqui que é o título mais importante da história do Atlético. Se eu me considero o melhor presidente do Atlético. Mas não falaram que eu fui para o hospital, que eu tive pico de pressão, problema alérgico, que eu chamei até pai de santo aqui em casa. Esqueceram de um monte de coisa do presidente do Atlético, que chora, toma de 6 do Cruzeiro, fica sem sair de casa. Só falei aqui de Libertadores. Sabem o que é tomar de 6 do Cruzeiro? Não. Sabem o que é chamar pai de santo aqui dentro, de desespero? Não. Então, quero que respeitem a minha história. Eu tenho nota de atendimento do Mater-Dei. Tudo isso que falamos é gostoso, lúdico. Mas do hospital ninguém fala, ninguém foi lá me visitar não, né? Não é assunto de reportagem, né? “Ô Kalil, vamos fazer uma matéria que você se internou no hospital por causa do Atlético, que você passou mal em Goiás contra o Atlético-GO (em 2011), ficou 20 dias com o time fazendo tour em Goiás e Ceará para puxar quatro pontos e não cair”. Também não é matéria, né? Então, alto lá! Não quero matéria com meu nome, não. Só eu sei o que passei como presidente do Atlético. Tenho um pedacinho do coração dessa torcida, porque ela imagina o que eu passei. Não sou aquele rapazola de 49 anos que assumiu o Atlético, não. Sou um senhor de 64 anos, e quero ser respeitado.

Sobre a Arena MRV, você conhece o estádio, pretende ir lá?

– Claro, o estádio é meu. Quem pagou aquele estádio foram os atleticanos. Venderam nosso shopping para fazer o estádio. Basta pagar o ingresso e assistir ao jogo.

Você já foi lá?

– Não. Eu gosto de futebol. Não gosto de obra. Obra eu trabalhei a vida inteira. Quero ir lá para ver jogo.

Eu queria perguntar sobre essa discussão da Liga no futebol brasileiro.

– A Liga é fácil. A liga tem a boa e a ruim. Todo atleticano quer a liga boa. Eu, a diretoria atual, a antiga, o velhinho, o cachorro, a criança. Todos. Tem uma liga que vai entupir o Flamengo de dinheiro, e a liga melhor. Todos querem a melhor liga. Isso aí não é nenhuma interferência na vida do Atlético. A não ser que haja algo diferente do que a gente não sabe. Pelo que eu li, tem a liga boa e a liga podre.

Perfeito, encerramos.

– Acabou? Falar de Atlético é muito bom.

Tá vendo? Falou “Atlético” de novo. Mais uma entrevista sem falar “Galo”.

Ah, agora tem que pautar: “Fala ‘Galo’, ô caralho!”. Você sabe que, aqui, quando cai alguma coisa, e tem aquele barulho… Aqui pode quebrar tudo, é casa de avô. Mas quando cai, todo mundo grita “Galo”.

https://ge.globo.com/futebol/times/atletico-mg/noticia/2023/07/24/atletico-mg-a-toalha-a-profecia-e-o-delay-de-alexandre-kalil-no-titulo-da-libertadores-ha-exatos-10-anos.ghtml


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Comentários:
5
  • Paulo Soares disse:

    Alexandre Kalil colocou seu nome nome na prateleira de cima dos presidentes que foram “craques” na administração do Galo. Acho, só acho, que não existe o melhor presidente. Tivemos grandes presidentes que marcaram suas épocas. Hoje a maior parte da torcida não sabe quem foi Nelson Campos e muito menos quem foi o presidente ou presidentes responsáveis- Alfredo Furtado (21-22/24-25) 11. Leandro Castilho M. Costa (26-30) – pela construção do Estádio Presidente Antônio Carlos, que para época, talvez, tenha a mesma dimensão do novo estádio do Galo. No terreno do estádio de Lourdes foi construído o shopping que nos proporcionou conseguirmos o capital para construção da arena do Galo. No estádio da Colina conseguimos nosso primeiro grande título nacional em 1937.
    Já Nelson Campos , do título brasileiro de 1971, foi um dos responsáveis pela inauguração da Vila Olímpica, que foi um marco para época.
    Elias Kalil além de formar uma das maiores equipes da nossa história foi responsável pela aquisição do terreno da Cidade do Galo.
    A sua época cada um deixou sua marca e que muitos anos depois ainda trazem frutos para o clube.

  • William Dorneles disse:

    Kalil foi meu maior ídolo no futebol. Pena q envolveu em política! Eu precisava dessa entrevista para voltar a tê-lo como ídolo!

  • Jerônimo disse:

    Kalil foi o melhor presidente que o Atlético já teve. Sabia tudo de futebol e mais um pouco. Pena que o Galo não tenha mais um presidente, um pai, um benemérito que gosta do clube e o administra com amor, zelo e espírito de luta. De agora em diante o Galo tem é dono, acionista, investidor, balanço e lucro.

    Kalil me surpreendeu e foi um excelente prefeito. Soube gerir com excelência a prefeitura no período da Covid. Se ele se candidatar em 2024 terá o meu voto. BH não pode cair mãos dos idiotas, Bruno ou Nikolas, apoiadores do inominável.

    Será um atraso gigantesco para BH deixar que um desses dois imbecis gerencie a cidade.

  • Martens disse:

    Saudade do Galo de Verdade !! o Galo do Kali !!! Dava orgulho de SER ATLETICANO !!
    Hoje tem um bando de traíras las que ja optaram ate pela liga que vai entupir o flamerda de dinheiro!! Vergonha !!
    SAF aprovada :
    ” No relatório final, realizado na sexta-feira, não houve imputação de irregularidades ao ex-chefe do executivo municipal. Um dos temas da CPI foi as contrapartidas da Arena MRV. ” e ai ??? pediram desculpas a Kalil ??

  • Rawllinson Tomaz Miranda disse:

    Eu e muitos atleticanos dividimos Alexandre Kalil em fases.
    Uma figura importante na virada da história do Galo, quando sua ala política tomou as rédeas da mão de corruptos e incompetentes, logo após a era Paulo Cury. Inclusive ele presidindo o conselho. Depois veio a fase do executivo, quando ele arriscou mais(talvez intuição), do que Nélio Brant e Ziza Valadares e depois do marco de tomar 6 ao invés de rebaixar o rival. Após esse fato, kalil se eternizou. Teve méritos, arriscou, ganhou, mas também sem dúvidas potencializou nossa dívida. Imagino que a maioria dos torcedores preferem a Libertadores do que, talvez uma dívida menor, hoje, eu vendo meu clube sendo privatizado, não! Por fim, nada que Kalil fez dentro do Atlético, com seus méritos e deméritos, foi tão negativo como sua mudança de postura pessoal. Pra quem disse que não entraria na política, se tornou um “político” na sintetização da palavra.
    Para quem tanto admirei ao ponto de convencer minha esposa a votar nele, por posturas passadas, hoje escrevo com muita tristeza, a maior decepção política nos meus 60 anos de vida.