Às vezes ainda me perguntam porque gosto tanto de Conceição do Mato Dentro. É simples: a região, com a sua natureza, é das mais bonitas do mundo, e as pessoas muito especiais. Das mais simples às mais abastadas. As histórias do dia a dia são fantásticas e os papos de botecos envolvem casos de humildes moradores dos distantes distritos conceiçonenses a intelectuais famosos.
A cidade tem importância histórica, dos tempos do Brasil colônia, passando pelos anos JK, golpe militar de 1964 à redemocratização nos anos 1980.
Quem lê o livro 1808, do Laurentino Gomes, que fala de D. João VI e da vinda da família real para o país, vê a importância de Minas Gerais na geopolítica mundial daqueles tempos, graças ao ouro, diamante e outras riquezas, exploradas principalmente em Ouro Preto, Mariana, Diamantina, e Conceição do Mato Dentro.
Terra do saudoso José Aparecido de Oliveira, sinônimo da hospitalidade mineira, eterno embaixador do nosso estado junto à intelectualidade brasileira, ator importante da história política do Brasil, devido a seus laços com gente poderosa da direita, da esquerda e do centro, como Tancredo Neves, Magalhães Pinto, Jânio Quadros, Leonel Brizola, José Sarney e tantos outros, inclusive no exterior.
Terra do Dr. Herbert Carneiro, Juiz de Direito brilhante, que implantou o Juizado Especial do Mineirão, recém guindado à condição de um dos mais jovens desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Dos meus amigos de Conceição ouvi muitas frases e expressões genuinamente mineiras que incorporei ao meu vocabulário e que uso constantemente em minhas falas e textos, tipo “gastar vela com mau defunto”, do Dr. Dênio Pires Silva.
Ou a antológica “Se o velhaco soubesse o quanto é bom ser honesto, ele seria honesto até por velhacaria”, do saudoso professor João Lima, pai do João Bosco, Geraldo Afonso e do conhecidíssimo professor Tom Zé, hoje em Belo Horizonte.
Agora há pouco recebi cópia de e-mail enviado pelo engenheiro Renilson Guimarães (Pico) ao cunhado João Bosco, que tem tudo a ver com as conversas regadas a muito “xá com torradas” no Bar da Lili, do Raimundo Santíssimo, do Chiquinho do Deco e tantos outros:
“Diz a lenda que Rui Barbosa, ao chegar em casa, ouviu um barulho estranho
vindo do seu quintal. Chegando lá, constatou
haver um ladrão tentando levar seus patos de criação.
Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o, quando este
tentava pular o muro com os patos, disse-lhe:
– Oh, bucéfalo anácrono! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos
bípedes palmípedes, mas, sim, pelo ato vil e sorrateiro de profanares o
recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa.
Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares da minha
elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei, com minha bengala
fosfórica, bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te
reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada.
E o ladrão, confuso, diz:
_ Dotô, resumino, eu levo ou deixo os pato?”
E assim a vida segue em Conceição do Mato Dentro, que volta e meia é adotada por alguém que se cansa dessa correria das cidades grandes e resolve ir para lá em definitivo.