Do jornalista Juliano Paiva, no portal Dom Total:
* Roger poderia ter sido preso por cotovelada
Se fosse denunciado e condenado na Justiça Comum, meia cruzeirense poderia ficar até um ano na cadeia
Internauta, se você perder a cabeça e der uma cotovelada por trás em alguém, numa festa, restaurante ou faculdade, por exemplo, pode ter certeza, as chances de você ser processado e responder por algum crime, e talvez até mesmo ser preso, são boas.
Mas se você for um jogador de futebol certamente essa sua agressão passará impune. É o que acontece em nosso país. O último exemplo disso ocorreu no clássico entre Atlético e Cruzeiro, dia 8 de abril, pelo Campeonato Mineiro.
Na ocasião, o meia celeste Roger, intencionalmente, deu uma cotovelada nas costas do atacante alvinegro Danilinho. E o que aconteceu com Roger? Nada!
Código Penal Brasileiro
Se você agredir alguém ou causar alguma lesão corporal, mesmo que mínima, como fez Roger, mas fora das quatro linhas, porque pelo visto no gramado tudo é permitido, você pode ser denunciado por crime de lesão corporal, art. 129 do Código Penal, e pegar de três meses a um ano de prisão.
Na cadeia
Conversei com Carlos Henrique Amaral, professor e advogado da Escola Superior Dom Helder Câmara, especialista em Direito Penal, sobre este assunto.
Segundo ele, Roger poderia ter ido parar na delegacia logo após o clássico. Para tanto, Danilinho, no caso a vítima, e somente ele, poderia, através de um Termo Circunstanciado de Ocorrência, ter comunicado o fato, oferecendo uma representação contra o jogador do Cruzeiro que responderia por um crime.
O caso poderia ser encaminhado ao Juizado Especial Criminal, e lá, caso não houvesse um acordo entre o agressor, Roger, e a vítima, Danilinho, o atleta cruzeirense poderia ser punido com até um ano de prisão, pena que poderia ser substituída por uma prestação de serviço à comunidade.
Crime
O que Roger fez é considerado um crime de menor potencial ofensivo, segundo Carlos Henrique Amaral. Apesar de “protegido” pela Justiça Desportiva, o ato do meia celeste é considerado crime por se tratar de um fato típico. “Ou seja, a ação de Roger nada teve a ver com o esporte e é um crime de lesão previsto no Código Penal”, explica Carlos Henrique.
Justiça Desportiva inofensiva
Diante disso, está mais do que claro o quão inócua é a Justiça Desportiva em nosso país. Um ato que é considerado crime pelo Código Penal Brasileiro passa impune simplesmente pelo fato de o agressor ser um jogador de futebol.
O efeito suspensivo é a aberração que permite isso. Ainda existe uma chance de Roger ser punido pela Justiça Desportiva. É preciso que o jogador seja condenado no Pleno do TJD-MG.
Porém, o novo julgamento ainda não tem data definida e pode ser que nem aconteça antes do término do Campeonato Mineiro. Se punido, então, Roger só cumpriria a pena no próximo Estadual, se ainda estiver no Cruzeiro.
O caso agora está nas mãos de Sérgio Murilo Diniz Braga, presidente do TJD-MG, que deve marcar a data do novo julgamento.
Problemas particulares
Por qualquer ângulo que se olhe esse caso de agressão do Roger há algo errado. A estratégia do departamento jurídico do Cruzeiro foi não comparecer ao julgamento.
O clube, então, pediu a anulação do julgamento porque seu advogado, Sérgio Rodrigues, que acompanharia o armador no TJD-MG, alegou problemas particulares para não ir à sessão.
O jogador, que também não foi ao tribunal, foi julgado sem defesa. Mas porque o Cruzeiro não mandou outro advogado? Sérgio Rodrigues seria o único competente para tanto no clube? Essa estratégia é manjada e contribui para a impunidade.
Licença para agredir
Não sei se Roger pensou nisso antes de agredir Danilinho ou mesmo o departamento jurídico do Cruzeiro e os integrantes do TJD-MG, mas o que está sendo dito e reafirmado enfaticamente, inclusive para as milhões de crianças que acompanham seus ídolos, é que um jogador tem licença para agredir. O que Roger fez e o que é permitido pela Justiça Desportiva, no caso especifico o TJD-MG, são péssimos exemplos para todos em termos de ética e convivência humana.
Quem deve lamentar…
Quem deve estar lamentando o episódio é o América. Roger foi decisivo nos dois gols celestes contra o Coelho neste domingo, no primeiro jogo da semifinal. Além de marcar um gol, foi dele o chute que resultou num rebote para Bobô balançar as redes. É um ótimo exemplo de como a impunidade pode interferir no resultado de um jogo e/ou campeonato.
A Tempo
Existe no nosso país um caso de jogador punido criminalmente por uma agressão dentro do gramado. O Caso é citado no livro “Curso de Direito Penal – Parte Especial – Volume 2“, do jurista Fernando Capez, páginas 147-148:
“Em 1989, um jogador do Grêmio Porto-Alegrense, em uma partida válida pela Copa do Brasil, desferiu um pontapé no rosto do centroavante do Palmeiras, o qual já estava caído, com a partida momentaneamente interrompida. Tal fato nada teve a ver com o esporte, sendo o caso tipificado como lesões corporais (o jogador acabou condenado criminalmente)”.
Os jogadores citados acima são Darci, do Grêmio, e Mirandinha, do Palmeiras.
Vídeo
Confiram abaixo o lance polêmico envolvendo Roger e Danilinho. Reparem que Roger não se contenta em dar apenas uma cotovelada. Ele usa todo o peso do seu corpo para desferir o golpe. É algo claramente premeditado e consciente.
Portanto, o novo julgamento deveria ser marcado o quanto antes e a pena, na verdade, deveria ser aumentada, pois quatro jogos apenas ficou barato para este crime.
Este novo julgamento, se acontecer, deveria questionar Roger também sobre a incitação à violência no final da partida. Roger provoca a torcida do Atlético ao mostrar um “6” com as mãos, referência clara à goleada aplicada pelo Cruzeiro no ano passado.
Juliano Paiva é jornalista formado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Atualmente editor do Dom Total, Paiva trabalhou nos jornais O Tempo, Hoje em Dia e no extinto Diário da Tarde, tradicional periódico de Belo horizonte fechado pelos Associados Minas em julho de 2007. No DT, começou como repórter da editoria Cidades, mas, na época do fechamento do jornal, fazia cobertura esportiva. Também foi responsável pela cobertura de jogos do Campeonato Brasileiro para a Folha de São Paulo no segundo semestre de 2007.